Doutrina Truman

A Doutrina Truman representa um marco fundamental na história da Guerra Fria e da política externa dos Estados Unidos, estabelecendo as bases para a estratégia de contenção do comunismo que moldaria as relações internacionais por décadas. Para os estudantes que buscam compreender este período crucial, é essencial desvendar suas origens, objetivos, características e as profundas consequências que teve em diversas partes do mundo, incluindo o Brasil.

O Que Foi a Doutrina Truman? Uma Definição Essencial

A Doutrina Truman foi um conjunto de medidas de política externa adotado pelos Estados Unidos, sob a presidência de Harry S. Truman, com o objetivo principal de combater o avanço do comunismo globalmente. Anunciada ao Congresso Nacional em 12 de março de 1947, essa doutrina formalizou a nova postura intervencionista dos EUA no cenário internacional.

No meio do pensamento de Harry S. Truman, o mundo pós-nazifascismo se encontrava diante de uma escolha fundamental entre dois "modos de vida" antagônicos, frequentemente sem a liberdade plena para decidir. De um lado, a democracia liberal, representada pelos EUA, caracterizada por instituições livres, governo representativo, eleições livres, garantias de liberdades individuais (expressão, religião) e ausência de opressão política. De outro, o comunismo, encarnado pela União Soviética (URSS), que impunha a vontade de uma minoria à força sobre a maioria, com base no terror, opressão, controle da imprensa e do rádio, eleições manipuladas e supressão das liberdades pessoais.

Diante dessa polarização, Truman declarou que a política dos Estados Unidos deveria ser "apoiar os povos livres que estão resistindo a tentativas de subjugação por minorias armadas ou por pressões externas". Isso implicava fornecer apoio político, estratégico e financeiro a países ameaçados pelo domínio ou influência comunista soviética.

Contexto Histórico: Os Fatores que Moldaram a Doutrina

A Doutrina Truman não surgiu isoladamente, mas como resultado de uma complexa teia de eventos e percepções no cenário global pós-Segunda Guerra Mundial.

1. O Fim da Aliança e a Ascensão da Bipolaridade:

   • Após a vitória sobre a Alemanha nazista, a cooperação entre os EUA e a URSS, aliados durante a Segunda Guerra Mundial, rapidamente se desfez.

   • As duas superpotências emergentes, os Estados Unidos (com sua visão liberal-capitalista) e a União Soviética (com sua ideologia socialista-comunista), entraram em uma intensa rivalidade, buscando disseminar suas respectivas visões para uma nova ordem global.

   • Essa divisão ideológica em dois blocos expressava um contexto maniqueísta na política internacional da Guerra Fria (1945-1991), que não se restringia à esfera política, mas também abrangia as dimensões econômica, sociocultural e militar.

2. As Crises Imediatas na Grécia e Turquia:

   • O catalisador mais direto para a Doutrina Truman foi o pedido de ajuda da Grécia e da Turquia no início de 1947.

   • Ambas as nações saíram da Segunda Guerra Mundial em uma situação de fragilidade política, econômica e social, com grande pobreza e infraestrutura econômica enfraquecida pela ocupação alemã.

   • Crise Turca (1946): A União Soviética pressionou o governo turco para obter direitos de trânsito livre através dos estreitos turcos (Bósforo), que conectam o Mar Negro ao Mediterrâneo. As tensões aumentaram com a demonstração de força naval soviética. Os EUA enviaram ajuda militar para garantir o controle turco da passagem.

   • Guerra Civil Grega (1946-1949): No final de 1946, a Grã-Bretanha informou aos EUA que não podia mais fornecer apoio militar e econômico ao governo grego, que combatia guerrilheiros do Partido Comunista da Grécia (KKE). Embora Joseph Stalin não estivesse ativamente ajudando os comunistas gregos (diferentemente de Josip Broz Tito da Iugoslávia, que os financiava), Washington e Londres percebiam as ações como uma tentativa soviética de tornar as nações do sul da Europa comunistas.

   • A administração Truman via a crescente agitação na Grécia como um "movimento de pinça" contra as regiões ricas em petróleo do Oriente Médio e os portos de águas quentes do Mediterrâneo. Havia o temor de um "efeito dominó": se a Grécia caísse para o comunismo, a Turquia não duraria muito, e a perda da Turquia colocaria a Grécia em perigo, fortalecendo a capacidade soviética de cortar as linhas de suprimento aliadas em caso de guerra.

3. O "Telegrama Longo" e a Perspectiva da Contenção:

   • Em fevereiro de 1946, George F. Kennan, um diplomata americano em Moscou, enviou seu famoso "Telegrama Longo", que pintava um quadro alarmante de uma liderança soviética "expansionista". Kennan argumentava que os soviéticos só responderiam à força e que a melhor forma de lidar com eles seria através de uma estratégia de contenção de sua expansão geográfica.

   • É importante notar que, embora Kennan seja creditado com a ideia da contenção, ele mais tarde sentiu que a política que se concretizou, especialmente com o NSC-68, era muito mais agressiva e abertamente confrontadora do que ele havia imaginado inicialmente.

4. A Retórica de Truman e a "Doutrinação" do Público:

   • Para que a legislação de auxílio fosse aprovada, Truman precisava do apoio dos republicanos, que controlavam ambas as casas do Congresso.

   • O Secretário de Estado Substituto, Dean Acheson, utilizou a "teoria do dominó" em termos dramáticos, comparando um estado comunista a uma "maçã podre que poderia espalhar sua infecção para um barril inteiro".

   • O influente senador republicano Arthur Vandenberg aconselhou Truman a "assustar para valer o povo americano" para garantir a aprovação.

   • No seu discurso, Truman evitou mencionar explicitamente o "comunismo", preferindo se referir a "regimes totalitários", o que permitia associar, na percepção pública, os regimes nazista e japonês recentemente derrotados ao regime soviético existente.

   • Apesar de algumas críticas (como a de Walter Lippmann sobre a natureza "aberta" do compromisso de Truman e a de outros sobre o caráter repressivo da monarquia grega), o temor da ameaça comunista garantiu a aprovação de US$ 400 milhões em ajuda militar e econômica para a Grécia e a Turquia em maio de 1947.

Os Múltiplos Objetivos da Doutrina Truman: Para Além da Ajuda Financeira

Os objetivos da Doutrina Truman eram multifacetados, combinando uma preocupação ideológica com interesses geopolíticos e econômicos.

• Contenção do Comunismo Globalmente: O objetivo primordial era impedir a propagação do socialismo-comunismo, visto como uma ameaça existencial aos interesses dos EUA e à ordem liberal-capitalista mundial.

• Apoio a Países Ameaçados: Oferecer suporte político, econômico e militar a nações que estivessem sob pressão para aderir ao bloco soviético, especialmente aquelas com governos instáveis ou em guerra civil.

• Defesa da Democracia Liberal: Promover e proteger os princípios associados ao modelo americano, como liberdades individuais e coletivas, liberdade de imprensa, eleições livres e economia de mercado.

• Proteção de Interesses Petrolíferos e Rotas Estratégicas: Embora a menção ao petróleo tenha sido deliberadamente removida do discurso de Truman, a proteção dos vastos interesses petrolíferos americanos e ocidentais no Oriente Médio, bem como das rotas marítimas e aéreas vitais, era um objetivo subjacente crucial. O Oriente Próximo e o Oriente Médio eram reconhecidos como a maior potencialidade de reservas de petróleo conhecida no mundo, com empresas americanas já detendo uma parcela significativa das reservas estrangeiras.

• Garantir Acesso a Bases de Abastecimento: A Comissão O'Mahoney concluiu que a guerra revelou a importância de ter bases de abastecimento em pontos estratégicos no exterior. Para garantir que essas instalações estivessem à disposição das forças militares americanas em emergências, era necessário ter mercados em tempo de paz.

• Manutenção da Hegemonia Americana: A doutrina serviu como um meio de propagar os ideais liberal-democráticos dos EUA para atingir seus objetivos hegemônicos e unilaterais, legitimando a ampliação de seus interesses de segurança nacional. O objetivo era que a vasta fonte de energia do Oriente Médio permanecesse em "mãos inteiramente amigas", ou seja, sob completo controle político dos Estados Unidos.

Consequências e Desdobramentos: Moldando o Pós-Guerra

A Doutrina Truman teve consequências abrangentes, não apenas na política externa dos EUA, mas também na estrutura geopolítica global e nas realidades internas de diversos países.

1. O Plano Marshall (Programa de Recuperação Europeia):

   • Foi um desdobramento econômico concreto da Doutrina Truman.

   • Proposto pelo Secretário de Estado George C. Marshall em junho de 1947, o plano visava a reconstrução das economias europeias devastadas pela guerra.

   • A intenção era fortalecer esses países economicamente para que seus governos e sociedades não fossem suscetíveis à influência comunista soviética. O Plano Marshall destinou bilhões de dólares para a reconstrução, sendo uma forma de aplicar os ideais da Doutrina Truman na prática.

2. A Criação da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte):

   • Outra consequência militar direta da Doutrina Truman foi a formação da OTAN.

   • Estabelecida em abril de 1949, a OTAN era uma aliança militar anti-soviética voltada para a segurança coletiva na Europa. Ela serviu como o "braço armado" da luta contra o comunismo.

3. Expansão da Intervenção Americana e Criação de Mecanismos de Segurança:

   • A doutrina estabeleceu um precedente para a assistência americana a regimes anticomunistas em todo o mundo, independentemente de quão antidemocráticos fossem. Exemplos notáveis incluem o apoio a ditaduras na América Latina, e regimes como o fascismo em Portugal e Espanha.

   • A doutrina também levou à criação de novas estruturas de segurança nacional nos EUA, como o Conselho de Segurança Nacional (NSC), o Departamento de Defesa e a Agência Central de Inteligência (CIA) em julho de 1947, através do Ato de Segurança Nacional. A Força Aérea dos EUA também foi criada neste contexto.

   • Na América Latina, Truman estendeu a estratégia de contenção com a assinatura do Pacto do Rio (Tratado Interamericano de Assistência Recíproca - TIAR) em setembro de 1947, que considerava um ataque a um estado americano como um ataque a todos. Além disso, o Programa Ponto Quatro (1949) ofereceu assistência técnica, e a Aliança para o Progresso (1961-1969), sob Kennedy, buscou modernizar a região para deter o avanço comunista, investindo US$ 20 bilhões em assistência.

   • A estratégia americana também envolveu operações secretas, como a orquestração de golpes militares, e represálias econômicas para destituir supostos líderes comunistas ou países que não se alinhassem aos EUA.

4. A Doutrina como Metáfora e sua Evolução:

   • A Doutrina Truman tornou-se uma metáfora para a ajuda destinada a afastar uma nação da influência comunista. Truman usou a imagem de "doença" para comunicar a sensação de desastre iminente da propagação do comunismo, criando uma "visão retórica" de contê-lo por meio de um escudo protetor em torno de países não comunistas.

   • A contenção, embora iniciada por Kennan com a ideia de uma estratégia a longo prazo e paciente, evoluiu para uma política mais assertiva, especialmente após o documento NSC-68 (1950), que defendia um rápido fortalecimento político, econômico e militar do "mundo livre".

   • Apesar dos altos custos envolvidos na manutenção de um vasto arsenal e na prestação de ajuda (uma preocupação levantada pelos críticos já em 1947), os proponentes da doutrina argumentavam que a alternativa – uma Terceira Guerra Mundial ou a permissão da expansão soviética – seria ainda mais dispendiosa.

A Doutrina Truman e o Brasil: Um Espelho da Influência Global

A Doutrina Truman, e a ideologia da contenção que ela representava, teve um impacto profundo e duradouro na política brasileira, especialmente na esfera militar e de segurança nacional.

1. A Introdução da Doutrina de Segurança Nacional (DSN) no Brasil:

   • A ideologia de contenção do comunismo, promovida pelos EUA, foi introduzida e institucionalizada no Brasil com a fundação da Escola Superior de Guerra (ESG) em 1949. A ESG foi explicitamente inspirada nos moldes da Escola Nacional de Guerra dos Estados Unidos (National War College).

   • A DSN brasileira, desenvolvida pela ESG, baseava-se em quatro elementos fundamentais: objetivos nacionais, segurança nacional, poder nacional e estratégia nacional.

   • A intenção dos criadores da ESG era "insuflar na consciência de nossa elite (...) uma compreensão ampla e uniforme sobre os problemas da segurança nacional", com o objetivo de transformar o Brasil em um país "forte e moderno" e uma "grande potência". Essa visão do "Brasil-potência" foi assimilada por políticos, diplomatas e jornalistas brasileiros, refletindo a idolatria ao poder importada da doutrina americana.

2. O Anticomunismo no Contexto Brasileiro:

   • O Brasil já possuía um histórico de anticomunismo desde a década de 1930, com a criação da Delegacia Especial de Segurança Política e Social (DESPS) em 1933. A Lei de Segurança Nacional (LSN), promulgada em 1935 e reformulada diversas vezes, definia crimes contra a ordem política e social, sendo um instrumento rigoroso de repressão.

   • O temor das elites governantes ao populismo e aos movimentos sociais populares no Brasil (especialmente entre 1930 e 1946) contribuiu para a adoção da DSN, que reforçava o caráter emergencial de sua implantação como princípio estabilizador sociopolítico.

   • Para as elites brasileiras, a DSN funcionou tanto como instrumento de manutenção do status quo quanto como meio de propagação dos ideais democráticos americanos, embora esses ideais nem sempre se adaptassem facilmente à realidade brasileira.

3. Mecanismos de Ingerência e Treinamento Militar:

   • A influência dos EUA nos exércitos latino-americanos se deu através de três frentes: integração das forças armadas do continente, ajuda militar e venda de armamentos, e programas de formação militar.

   • Comissões como a Comissão Mista Brasil-EUA para o Desenvolvimento Econômico (Abbink Commission), a Comissão Militar Mista Brasil-EUA (CMMBEU) e a Comissão Mista de Defesa Brasil-EUA garantiram a cooperação e o alinhamento em troca de financiamentos, assistência técnica e armamentos.

   • O treinamento militar era realizado em instituições americanas como o National War College e a US Army School of the Americas (USARSA/SOA) – conhecida como "Escola das Américas" – além da própria ESG no Brasil. Entre 1961 e 1975, mais de 71 mil militares latino-americanos passaram por essas escolas.

   • Os manuais da USARSA/SOA incluíam métodos e técnicas de interrogação de suspeitos (inclusive com o uso de violência) e doutrinas de guerra revolucionária e ideologia comunista. No Brasil, a ESG também ensinava sobre "Guerra Revolucionária" e "Guerra Psicológica". Essa estratégia contrarrevolucionária foi fundamental na formação de uma "escolástica militar rígida" que, a partir de 1961, serviu de base para os exércitos latino-americanos.

4. A Instalação do Estado de Segurança Nacional no Brasil (1964-1969):

   • A doutrina de segurança nacional estadunidense foi incorporada nos estados latino-americanos com tal "espontaneidade" que conseguiu atingir seus fins hegemônicos. No Brasil, isso se traduziu na intervenção militar de 1964, que inaugurou o Estado de Segurança Nacional, de natureza autoritária.

   • Embora a DSN por si só não tenha sido a única responsável pelo golpe, ela contribuiu para a crescente valorização do papel da instituição militar para a estabilidade socioeconômica e para a institucionalização de princípios e métodos de contenção no cotidiano político-militar brasileiro.

   • O regime militar (1964-1984) buscou restabelecer a ordem política e social, conter os ideais comunistas e a "subversão" (o "inimigo interno"), dispersar movimentos de oposição e promover um projeto desenvolvimentista.

   • Os Atos Institucionais (AI), decretados entre 1964 e 1969, foram os principais instrumentos para legitimar a tomada e manutenção dos militares no poder, representando o período mais repressivo da história democrática do Brasil pós-II Guerra Mundial.

     • AI Nº 1 (1964): Modificou a Constituição de 1946, conferindo aos comandantes-em-chefe das Forças Armadas o poder de suspender direitos políticos e cassar mandatos legislativos.

     • AI Nº 2 (1965): Tornou as eleições presidenciais indiretas, suspendeu garantias, extinguiu partidos e transferiu o julgamento de civis pela Lei de Segurança Nacional para a Justiça Militar.

     • AI Nº 3 e Nº 4 (1966): Tornaram indiretas as eleições estaduais e municipais e convocaram o Congresso para debater uma nova constituição, aprovada em 1967.

     • AI Nº 5 (1968): O mais conhecido e repressivo, suspendeu o habeas corpus para determinados crimes, permitiu o recesso do Congresso e a cassação de mandatos, e consolidou os "poderes absolutos" do presidente.

     • AI Nº 6 a Nº 17 (1969): Medidas adicionais para conter e reprimir a oposição, incluindo a reformulação e maior rigidez da Lei de Segurança Nacional.

   • Apesar de parte da sociedade brasileira realmente temer o comunismo, a ideologia de contenção, aliada ao histórico autoritário e intervencionista do Estado brasileiro, resultou na institucionalização de ideias e práticas repressivas. O "exército transformou-se em força de ocupação dentro de seu próprio país e o povo em inimigo real ou potencial".

Dúvidas Comuns e Mitos sobre a Doutrina Truman

A Doutrina Truman é um tópico complexo que frequentemente gera perguntas e equívocos. Vamos esclarecer alguns deles:

• A Doutrina Truman foi um esforço puramente humanitário?

  • Não. Embora o discurso de Truman tenha sido apresentado em termos de apoio econômico e moral a países em necessidade, especialmente Grécia e Turquia, as fontes indicam que havia um forte componente geopolítico e econômico. O memorando inicial reconhecia que o "primeiro objetivo é proteger o nosso petróleo no Oriente Médio e refrear a Rússia". O próprio Acheson, interrogado por um senador, admitiu que os únicos interesses diretos dos EUA na Arábia Saudita eram os das companhias petrolíferas americanas. A menção de "grandes recursos naturais" do Oriente Médio foi deliberadamente removida do discurso de Truman, mas a guarda do acesso ao petróleo era uma parte importante da doutrina. Portanto, foi predominantemente uma estratégia, habilmente mascarada por uma retórica humanitária e democrática.

• A Doutrina Truman foi a única causa da Guerra Fria?

  • Não. A Doutrina Truman é amplamente reconhecida pelos historiadores como um momento definidor e um ponto de partida para a Guerra Fria. No entanto, ela não foi a única causa, mas sim "apenas mais um passo no caminho para a Guerra Fria". A rivalidade entre EUA e URSS já estava em ascensão desde o fim da Segunda Guerra Mundial, marcada por eventos como a Crise do Irã, a Crise Turca, o "Telegrama Longo" de Kennan e o fracasso do Plano Baruch para o controle internacional da energia atômica. A doutrina cimentou a mudança da política externa dos EUA de uma aliança em tempo de guerra para a contenção da expansão soviética.

• A política de contenção foi equivocada ou necessária para manter a paz?

  • Essa é uma questão central de debate histórico. A liderança dos EUA na época, incluindo Truman, acreditava que a abordagem de contenção (em oposição a um ataque direto à URSS) era a maneira de evitar uma guerra total, especialmente uma nuclear. Eles viam a União Soviética como "agressivamente expansionista" e justificavam a contenção como a principal alternativa para deter essa expansão, ao mesmo tempo em que esperavam evitar um conflito direto. A Segunda Guerra Mundial estava fresca na mente de todos, e eles viam as táticas soviéticas como semelhantes à expansão de Hitler, buscando evitar a "capitulação".

  • Os críticos, no entanto, apontavam para o custo imenso de manter um grande arsenal e suprimentos. Além disso, para manter o apoio ao plano, a URSS precisava ser constantemente apresentada como uma ameaça e um inimigo inerente, o que impediria a paz e a estabilidade. A questão mais perspicaz é: quais eram as alternativas plausíveis na mesa na época, e como a contenção se tornou a escolhida?.

• A Doutrina Truman realmente impediu o avanço comunista?

  • Em casos específicos, como na Grécia, o aumento da ajuda americana assistiu o governo grego na derrota do KKE (Partido Comunista Grego). Mais amplamente, a doutrina "estabeleceu um precedente para a assistência americana a regimes anticomunistas em todo o mundo". Sua influência na institucionalização de práticas anticomunistas e na formação de alianças militares globais (como a OTAN) é inegável. No entanto, ela também contribuiu para o apoio a regimes antidemocráticos, o que levanta questões sobre o verdadeiro custo de tal "contenção" para os valores democráticos que os EUA afirmavam defender.

• Como a ideia de "contenção" mudou ao longo do tempo?

  • Originalmente concebida por George Kennan em seu "telegrama longo" como uma contenção mais limitada e paciente, a ideia se traduziu em uma política muito mais agressiva e de confronto aberto na implementação, como evidenciado pelo NSC-68. Essa evolução mostra que mesmo o conceito de "contenção" era fluido e sujeito a diferentes interpretações e "escolhas" políticas, culminando em uma versão da contenção que se manifestou em realidades físicas com impacto global.

Considerações Finais: Um Legado Complexo

A Doutrina Truman foi, sem dúvida, um divisor de águas na história do século XX. Ela marcou a transição da política externa dos EUA de um isolacionismo relativo para um envolvimento global ativo e intervencionista. Ao fazê-lo, ela não apenas redefiniu o papel dos Estados Unidos no mundo, mas também impulsionou a polarização ideológica da Guerra Fria, com consequências que reverberaram por décadas.

Embora a doutrina tenha sido eficaz em conter a expansão do comunismo em algumas regiões e tenha pavimentado o caminho para importantes iniciativas como o Plano Marshall e a OTAN, seu legado é complexo. A ênfase na segurança do Estado em detrimento dos direitos humanos, o apoio a regimes autoritários e a institucionalização de práticas repressivas, como observado no Brasil com o Estado de Segurança Nacional e os Atos Institucionais, são aspectos críticos de sua aplicação. A Doutrina Truman nos lembra que as decisões de política externa são moldadas por uma interação de ideologias, interesses geopolíticos, percepções de ameaça e o contexto histórico, cujos resultados podem ser tanto benéficos quanto prejudiciais para os povos envolvidos.

Questões de Múltipla Escolha:

1. Qual foi o objetivo principal da Doutrina Truman anunciada pelo presidente Harry S. Truman em 1947?
   A) Promover o comunismo como sistema político mundial
   B) Conter a expansão do comunismo e apoiar países ameaçados
   C) Estabelecer uma aliança militar com a União Soviética

2. Qual programa de ajuda econômica foi baseado na Doutrina Truman e destinado à reconstrução da Europa pós-Segunda Guerra Mundial?
   A) Plano Roosevelt
   B) Plano Kennedy
   C) Plano Marshall

3. Que aliança militar foi formada como resultado da Doutrina Truman, liderada pelos Estados Unidos e visando a defesa mútua contra a ameaça comunista?
   A) OPEP
   B) OTAN
   C) OEA

Gabarito:

1. B) Conter a expansão do comunismo e apoiar países ameaçados

2. C) Plano Marshall

3. B) OTAN