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24/08/2025 • 25 min de leitura
Atualizado em 24/08/2025

Liberdade de expressão

1 A Liberdade de Expressão como Direito Fundamental

A liberdade de expressão é um dos pilares essenciais do constitucionalismo estruturante do Estado e um direito fundamental indispensável à existência da democracia. No Brasil, este direito encontra amparo em diversas disposições da Constituição Federal de 1988.

1.1 Conceito e Natureza Jurídica

A liberdade de expressão permite ao cidadão expor suas ideias e opiniões, atuando de forma eficaz e transformadora no processo democrático. Ela abrange não apenas a manifestação do pensamento, mas também a criação, a expressão e a informação em qualquer formato. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), em seu Artigo XIX, estabelece que todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão, incluindo a liberdade de buscar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

É um direito que se manifesta como uma prerrogativa institucionalizada de interesses políticos resguardados por normas jurídicas de superioridade normativa. A linguagem constitucional brasileira, no entanto, é por vezes abstrata, oferecendo poucos indicativos sobre como solucionar conflitos entre interesses políticos constitucionalmente garantidos.

1.2 A Liberdade de Expressão na Constituição Federal de 1988

No ordenamento jurídico brasileiro, a liberdade de expressão é amplamente protegida:

  • Art. 5º, inciso IV: Garante a livre manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. A vedação ao anonimato visa garantir a responsabilização caso a manifestação cause dano a terceiros.

  • Art. 5º, inciso IX: Assegura a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

  • Art. 220: Reafirma que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação não sofrerão qualquer restrição, sendo vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

  • Art. 221: A produção e programação de emissoras de rádio e televisão devem atender a princípios como finalidades educativas, artísticas, culturais e informativas, promoção da cultura nacional e regional, e respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

A Constituição de 1988 representou inovações significativas em relação à liberdade de manifestação do pensamento, ampliando o rol de direitos e garantias individuais. Este direito é caracterizado como um direito da personalidade, essencial para a concretização da dignidade da pessoa humana.

1.3 A Dupla Dimensão da Liberdade de Expressão: Individual e Coletiva

A liberdade de expressão não possui apenas uma dimensão individual, mas também uma coletiva ou difusa.

  • Como direito individual: Consiste no direito de cada pessoa compartilhar livremente seus pensamentos, ideias e informações.

  • Como direito coletivo/difuso: Trata-se do direito da sociedade de obter informações e receber, livre de interferência e obstáculos, os pensamentos, ideias, opiniões e informações dos outros.

Conhecer o pensamento alheio é tão importante quanto expressar o próprio. Essa dupla dimensão é fundamental para a interação humana e para a construção coletiva da realidade em uma sociedade democrática.

1.4 Liberdade de Expressão e Democracia

A liberdade de expressão é um direito vital para qualquer democracia. Governos democráticos geralmente não controlam o conteúdo da maioria dos discursos, permitindo que muitas vozes expressem ideias diferentes e até contrárias. Um debate livre e aberto é fundamental para que as melhores opções sejam consideradas e para evitar erros graves.

A democracia depende de uma sociedade civil educada e bem-informada que tenha acesso à informação para participar plenamente da vida pública e criticar funcionários do governo ou políticas. A liberdade de expressão serve como um instrumento decisivo de controle da atividade governamental e do próprio exercício do poder. A divergência de ideias e o direito de expressar opiniões não podem ser restringidos para que a verdadeira democracia seja vivenciada.

No contexto brasileiro, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) tem defendido uma justificativa instrumental de fundo democrático para a liberdade de expressão. Essa leitura entende que a função primordial da liberdade de expressão é garantir um espaço livre de interferência estatal para que o cidadão possa expressar sua oposição política e fortalecer o regime democrático. A superação de resquícios censórios da Ditadura Militar e o fortalecimento do Estado Democrático de Direito são objetivos centrais concretizados pela liberdade de expressão.

2 Limites da Liberdade de Expressão

Embora fundamental, a liberdade de expressão não é um direito cujo exercício seja ilimitado e incondicionado. Ela deve ser exercida dentro dos limites traçados pela própria Constituição Federal e demais leis, que garantem sua efetividade, mas, ao mesmo tempo, restringem e relativizam seu alcance em face de outros direitos de mesma estatura jurídica.

2.1 O Caráter Não Absoluto do Direito

O direito à liberdade de expressão, como muitos outros direitos fundamentais, não é absoluto. Isso é explicitamente afirmado por documentos internacionais como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (Art. 19 e 20) e a Convenção Americana de Direitos Humanos (Art. 13). O exercício desse direito implica "deveres e responsabilidades especiais" e pode estar sujeito a certas restrições.

2.2 O Princípio do Dano de John Stuart Mill e suas Implicações

Um dos fundamentos filosóficos para a limitação da liberdade de expressão é o "princípio do dano" (harm principle), proposto por John Stuart Mill em seu livro "Sobre a Liberdade". Mill argumenta que a única razão legítima pela qual a humanidade, individual ou coletivamente, está autorizada a interferir na liberdade de ação de qualquer de seus integrantes é a autodefesa, ou seja, para evitar danos a terceiros.

Dessa forma, no que concerne apenas ao próprio indivíduo, cada ser é dotado de total autodeterminação. Mill defende que não se pode punir a autolesão e que o desejo de bem-estar de uma pessoa não é suficiente para restringir sua liberdade, desde que ela não esteja lesando mais ninguém. O máximo que se pode fazer é aconselhar e advertir.

Este princípio representa uma recusa ao paternalismo estatal excessivo, que trata o indivíduo como criança ao impedi-lo de praticar atos que só dizem respeito a si mesmo. Mill entendia que o Estado é necessário, mas não deve interferir demasiadamente nas liberdades individuais, pois isso resultaria na supressão da individualidade e, consequentemente, do desenvolvimento social.

2.3 Censura Prévia vs. Responsabilização Posterior

A Constituição Federal de 1988 veda expressamente toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem se manifestado consistentemente contra qualquer tentativa de restringir a liberdade de expressão antes da publicação ou divulgação de informações, considerando a censura prévia inadmissível. O livre trânsito de ideias é um elemento essencial à democracia.

No entanto, a proibição da censura prévia não impede o controle posterior pelo Judiciário de excessos eventualmente cometidos em face de outros direitos constitucionais de igual relevância, como a inviolabilidade da vida privada e da honra dos indivíduos. Documentos internacionais, como a Convenção Americana de Direitos Humanos, são taxativos ao afirmar que o exercício da liberdade de expressão não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei.

Qualquer restrição à liberdade de expressão deve satisfazer requisitos exigentes:

  • Previsão legal: A restrição deve estar taxativamente prevista em lei, não apenas por medidas administrativas. Normas vagas ou ambíguas são incompatíveis com a Convenção Americana.

  • Finalidade legítima e adequação: A restrição deve ter um objetivo legítimo em uma sociedade democrática (e.g., respeito aos direitos e reputação de terceiros, proteção da segurança nacional, ordem, saúde ou moral públicas) e ser idônea para atingi-lo. Não se justifica controle em nome da veracidade da informação ou imparcialidade da imprensa.

  • Necessidade: A restrição deve ser uma resposta a uma necessidade social premente, que não poderia ser atendida por meios menos restritivos. O direito de retificação ou resposta é preferível à reparação civil, e esta à sanção penal.

  • Proporcionalidade: O objetivo da restrição deve ser mais relevante que a limitação imposta à liberdade de expressão, fomentando um clima de abertura e tolerância a críticas, mesmo ácidas.

Em caso de dúvida, a preferência deve ser dada à liberdade de expressão, pois as limitações a um direito humano são exceções e devem ser interpretadas restritivamente.

2.4 Discursos Protegidos, Especialmente Protegidos e Não Protegidos

Em princípio, todos os tipos de discurso são protegidos pelo direito à liberdade de expressão, independentemente do conteúdo e do grau de aceitação social. O Estado tem uma obrigação geral de neutralidade quanto ao conteúdo das opiniões e ideias que circulam na esfera pública. Isso inclui a proteção de ideias perturbadoras, chocantes ou até ofensivas, que produzem desconforto.

2.4.1 Discursos Especialmente Protegidos

Certas categorias de discursos recebem proteção especial devido à sua forte conexão com o funcionamento e fortalecimento da democracia. São eles:

  • Assuntos políticos e de interesse público: O bom funcionamento da democracia exige o maior grau possível de discussão pública sobre os problemas da sociedade e a atuação do Estado. A liberdade de expressão é condição necessária para denunciar casos de corrupção.

  • Críticas e denúncias contra agentes públicos: Funcionários públicos, políticos e candidatos a cargos públicos devem ter um limite superior de tolerância a críticas, acusações e denúncias, dada a natureza pública de suas funções. Eles geralmente têm fácil acesso aos meios de comunicação para se defender, tornando dispensável a punição, salvo má-fé comprovada. A importância de não inibir o debate democrático é um fator crucial. Um sistema excessivo de responsabilização pode gerar autocensura, o que é nocivo à liberdade de expressão.

  • Liberdade de imprensa: A imprensa livre desempenha um papel essencial na proteção do regime democrático, viabilizando o controle social do poder.

2.4.2 Discursos Não Protegidos

Existem discursos que não são amparados pela liberdade de expressão, mas sua caracterização é extremamente rigorosa. Tais discursos são aqueles que fazem apologia do ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência. A liberdade de expressão não assegura o direito de incitar ao racismo, pois a Constituição veda atos discriminatórios, tendo a dignidade da pessoa humana como pilar fundamental. Da mesma forma, não protege atos de incitação à intolerância e ao ódio religioso.

A caracterização de "discurso de ódio" deve seguir critérios estritos:

  • Ódio como aversão absoluta: Deve aplicar-se a um sentimento de aversão absoluta (raiva), distinto de mero desprezo, preconceito ou antipatia.

  • Intenção de provocar ódio: Não se trata da mera expressão do ódio pessoal, mas de sua defesa com a intenção de provocar esse mesmo sentimento em outros.

  • Incitamento à ação: A defesa do ódio deve incitar à ação de discriminar, hostilizar, ou praticar a violência. A manifestação do ódio não é um crime por si só, mas apenas quando seu autor pretende provocar reações violentas no público.

  • Contexto, audiência e probabilidade de violência: Deve-se considerar o contexto, o alcance da mensagem, se foi recebida favoravelmente pela opinião pública, e a probabilidade de que atos de violência ou discriminação se sigam a esse discurso. A intervenção estatal só se justifica diante de um risco sério e iminente.

O fato de um discurso ser preconceituoso ou conter estereótipos não é suficiente para enquadrá-lo como discurso de ódio não protegido. O que está em jogo é a preservação da ordem pública contra a violência e a garantia da igualdade contra atos de discriminação.

3 Conflitos com Outros Direitos Fundamentais

A liberdade de expressão frequentemente entra em rota de colisão com outros direitos de mesma hierarquia constitucional, como a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. Nesses casos, a solução envolve juízos valorativos e ponderações.

3.1 Liberdade de Expressão vs. Honra, Intimidade e Privacidade

O direito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas é inviolável, garantindo o direito à indenização por dano material ou moral decorrente de sua violação. Quando princípios constitucionais colidem, nenhum deles é anulado; em vez disso, busca-se um equilíbrio, escolhendo aquele que deve preponderar à luz das circunstâncias concretas, sendo a alternativa decisória a menos restritiva possível aos direitos em colisão.

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem defendido que a liberdade de expressão não é ilimitada nem absoluta, devendo observar os demais direitos fundamentais, como a honra, a intimidade e a privacidade. Em casos de abuso, há previsão de responsabilização posterior.

A privacidade é um direito fundamental, essencial para o bem-estar, a criação de espaços de intimidade, o livre desenvolvimento da personalidade e a manutenção do Estado Democrático de Direito. Embora muitas vezes vista como um direito individual, a privacidade possui um valor social, moldando comunidades e protegendo indivíduos contra danos e intromissões, sendo indispensável para o exercício da cidadania.

A distinção entre o que é público e privado tornou-se mais desafiadora na sociedade da informação. A privacidade não tem um valor uniforme em todos os contextos e exige a análise das circunstâncias do caso concreto para determinar seu peso.

3.2 Crimes Contra a Honra (Calúnia, Difamação, Injúria)

A legislação penal prevê crimes contra a honra que servem como limites à liberdade de expressão.

  • Calúnia (Art. 138 CP): Imputar falsamente a alguém um fato definido como crime. Protege a honra objetiva (reputação).

  • Difamação (Art. 139 CP): Imputar a alguém um fato ofensivo à sua reputação (não criminoso). Protege a honra objetiva.

  • Injúria (Art. 140 CP): Ofender a dignidade ou o decoro de alguém (xingamentos). Protege a honra subjetiva (sentimento que a pessoa tem de si).

As penas para esses crimes podem ser aumentadas em diversas situações, como quando o crime é cometido na presença de várias pessoas, por meio que facilite a divulgação, ou se a vítima for figura pública (Presidente, chefe de governo estrangeiro, funcionário público, Presidente do Senado/Câmara/STF), criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência. A pena triplica se o crime for cometido ou divulgado em redes sociais.

A exceção da verdade é um mecanismo de defesa nos crimes contra a honra, permitindo ao acusado provar a veracidade do fato imputado, anulando o processo. Isso demonstra uma forma de coexistência entre a liberdade de expressão e a proteção dos direitos da personalidade.

Organizações internacionais, no entanto, tendem a condenar o uso do direito penal para proteger a honra, considerando os tipos penais de difamação ou outros delitos contra a honra como uma limitação cada vez mais injustificável à liberdade de expressão. O direito penal deve ser utilizado apenas em casos de danos graves e irreparáveis, preferindo-se o direito de resposta ou sanções civis. A difamação criminal gera um forte efeito de autocensura, especialmente para jornalistas.

3.3 Discurso de Ódio e Intolerância

Conforme detalhado no item 2.4.2, o discurso de ódio e a incitação à intolerância e à violência não são protegidos pela liberdade de expressão. O STF tem tomado medidas para responsabilizar indivíduos que promovem discursos que incitem a violência ou a discriminação.

A Lei 7.716/1989 (Lei dos Crimes Raciais) e suas alterações recentes (Lei 14.532/2023) definem e punem crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor, incluindo a injúria racial. A interpretação judicial considera discriminatória qualquer atitude ou tratamento a pessoas ou grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que não seria dispensado a outros grupos em razão de cor, etnia, religião ou procedência.

O STF já decidiu que a liberdade de expressão não comporta atos de incitação à intolerância e ao ódio em casos de discriminação religiosa. Em situações como a propagação de conteúdo antissemita ou negação do holocausto (Caso Ellwanger), o Tribunal consolidou que a liberdade de expressão não é incondicionada e não assegura o direito de incitar ao racismo.

3.4 Liberdade de Expressão no Debate Político e Críticas a Figuras Públicas

A liberdade de opinião deve ser resguardada até mesmo àqueles que atacam o próprio sistema democrático no debate político, com o Tribunal Constitucional da Espanha afirmando que "A Constituição protege também aqueles que a negam". Figuras públicas, como políticos, estão mais expostas ao escrutínio e à crítica do público e, portanto, devem ser mais tolerantes a discursos negativos. O debate público não deve ser empobrecido a ponto de desfavorecer pontos de vista necessários para o governo da sociedade.

A liberdade de expressão no debate público compreende não apenas informações inofensivas, mas também aquelas que possam causar transtornos, resistência e inquietude. As ofensas pessoais, embora indesejáveis, são parte do debate político, e aquele que ingressa em uma disputa eleitoral não pode ter "suscetibilidades maiores".

A jurisprudência interamericana reconhece discursos relacionados a assuntos políticos e de interesse público, ou que veiculam críticas ou denúncias contra agentes públicos no exercício de suas funções, como "especialmente protegidos", desfrutando de um maior nível de proteção. Isso visa fomentar a transparência governamental e a prestação de contas dos agentes públicos.

4 A Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF)

O Supremo Tribunal Federal (STF), como intérprete máximo da Constituição, desempenha um papel crucial na delimitação da amplitude e dos limites da liberdade de expressão. A análise da jurisprudência do STF a partir da Constituição de 1988 revela os critérios decisórios aplicados pela Corte.

4.1 Posicionamento do STF: Liberdade Não Ilimitada

Os julgados do STF evidenciam que a liberdade de expressão não é um direito cujo exercício seja ilimitado e incondicionado. Deve ser exercida nos limites traçados pela própria Constituição, que a garante, mas também restringe e relativiza seu alcance em face de outros direitos de mesma estatura jurídica.

O Tribunal tem admitido restrições em casos de incitação ao ódio, à intolerância e à violência, bem como em manifestações com conteúdo imoral. Além disso, a liberdade de expressão deve ser pautada pelo resguardo de outros direitos fundamentais, como a honra, a intimidade e a privacidade. As linhas que autorizam restrições ao exercício da liberdade de expressão são consideradas bastante estreitas.

4.2 A Função Contramajoritária do STF

O STF tem desempenhado uma importante função contramajoritária, protegendo direitos de grupos minoritários contra a opressão das maiorias. A atuação contramajoritária ocorre quando o STF invalida atos do Legislativo ou Executivo por violação à Constituição, cujos membros são eleitos pelo voto popular.

Essa função é crucial para assegurar a liberdade de expressão às minorias, permitindo-lhes manifestar-se livremente, mesmo que suas ideias sejam "desagradáveis, atrevidas, insuportáveis, chocantes, audaciosas ou impopulares".

4.3 A Doutrina da Posição Preferencial e o Teste da Proporcionalidade

A jurisprudência constitucional contemporânea do STF na solução de conflitos entre a liberdade de expressão e outros direitos constitucionais emprega principalmente dois testes: o da proporcionalidade e o da posição preferencial. No entanto, a força operativa desses testes na prática da Corte é por vezes difícil de distinguir devido à confusão conceitual.

  • Teste da Proporcionalidade: Sugere que não há nenhum aspecto inerente à natureza da livre expressão capaz de situá-la em posição diversa da ocupada pelos demais direitos, principalmente os relativos à personalidade. A resolução de conflitos se dá pela análise dos elementos fáticos do caso concreto, formulando um juízo de proporcionalidade. A teoria de Robert Alexy, frequentemente citada, descreve princípios como mandamentos de otimização a serem realizados na maior medida possível, resolvendo colisões por meio de sopesamento (exame de proporcionalidade).

  • Teste da Posição Preferencial: Sugere que a liberdade de expressão desfruta de uma vantagem não compartilhada com outros direitos fundamentais, especialmente os da personalidade, prevenindo conflitos ao declarar uma preponderância a priori. Alguns ministros, como Luís Roberto Barroso, defendem que a liberdade de expressão deve ser tratada como uma "liberdade preferencial", o que implica uma transferência do ônus argumentativo: quem pretende afastar a liberdade de expressão tem o dever de demonstrar os motivos para a prevalência de sua pretensão.

A pesquisa sobre a jurisprudência do STF entre 2017 e 2020 revelou uma divisão na Corte quanto ao teste a ser empregado. Contudo, mesmo os defensores da posição preferencial, como os Ministros Barroso e Fux, não se comprometeram com a sobreposição da liberdade de expressão em todo e qualquer caso, mencionando a necessidade de aplicar o teste da proporcionalidade em alguns momentos ou que a preferência dependerá das circunstâncias do caso. Essa abordagem foi cunhada como "posição preferencial relativa".

4.4 Casos Emblemáticos do STF

A jurisprudência do STF ilustra a aplicação desses princípios:

  • Habeas Corpus 831257/DF (2003): Reafirmou o exercício da liberdade de expressão como direito imprescindível à existência do Estado Democrático de Direito, denotando sua amplitude no contexto da Constituição de 1988.

  • Habeas Corpus 824242/RS - Caso Ellwanger (2003): Consolidou que a liberdade de expressão não é incondicionada e não assegura um suposto direito de incitação ao racismo, pois a Constituição veda atos discriminatórios e tem a dignidade da pessoa humana como pilar fundamental.

  • Habeas Corpus 83.996-7/RJ (2004): Decidiu que a liberdade de expressão não pode abrigar manifestações de conteúdo imoral que impliquem ilicitude penal.

  • Ação Originária 1390/PB (2011): O STF refutou a tese de que a liberdade de expressão seria ilimitada, afirmando que ela deve observar outros direitos fundamentais, como a honra, intimidade e privacidade. Críticas a pessoas públicas, embora toleráveis, não podem dar margem a acusações infundadas e ofensivas.

  • ADPF 187/DF - Marcha da Maconha (2011): Reconheceu a legitimidade da realização de eventos públicos para defender a legalização do uso de drogas ou criticar o modelo penal de repressão. O Tribunal assentou a função contramajoritária do STF em proteger a propagação de ideias de grupos minoritários, mesmo que impopulares, contra a opressão das maiorias.

  • Recurso Extraordinário 600063/SP (2015): Enfatizou que, no debate público, as ofensas pessoais, embora indesejáveis, são parte do processo. A liberdade de expressão compreende informações que podem ser causa de transtornos e inquietude.

  • ADI 4815/DF - Biografias (2015): O STF decidiu pela inexigibilidade de autorização prévia para divulgação de obras biográficas, considerando a autorização prévia como censura. A Corte reafirmou que a liberdade de expressão não pode ser cerceada pelo Estado ou por particulares, com a responsabilidade dos autores por ações indevidas sendo de caráter reparatório e posterior.

  • Reclamação 38782/RJ - Porta dos Fundos (2020): A Corte afastou restrições judiciais à exibição de obra, assinalando a importância da livre circulação de ideias e que a vedação de conteúdo deve ocorrer apenas em casos excepcionalíssimos de prática ilícita, incitação à violência ou discriminação, ou propagação de discurso de ódio.

  • Falas de Jair Bolsonaro (Inquérito 4.694): O STF classificou discursos discriminatórios e preconceituosos de Jair Bolsonaro como manifestações inseridas na noção poliárquica de liberdade de expressão, por estarem em um contexto de crítica a políticas públicas. A Corte acobertou o discurso com a imunidade parlamentar, indicando que manifestações racistas seriam essenciais ao conflito político e democrático quando relacionadas ao exercício do mandato. Essa postura reflete a resistência do tribunal em caracterizar tais falas como racistas, buscando preservar a tese de convivência racial harmoniosa no país.

5 Paternalismo Estatal e a Autonomia Individual

O debate sobre os limites da liberdade também se estende à crítica do paternalismo estatal, ou seja, à intervenção do Estado na vida do indivíduo para protegê-lo de si mesmo.

5.1 A Crítica ao Excesso de Intervenção Estatal

Para John Stuart Mill, o Estado não tem legitimidade para substituir uma decisão interna do indivíduo com a justificativa de protegê-lo de si mesmo, desde que o indivíduo seja capaz de se autodeterminar. Intervenções excessivas do Estado, a título de prevenir a "intemperança" ou promover o "bem-estar" do indivíduo, podem ser contraproducentes e levar à supressão da individualidade e do desenvolvimento social. Um paternalismo estatal exacerbado não foi o objeto pactuado no contrato social, que visa garantir a convivência harmoniosa, não a anulação da liberdade individual.

5.2 Exemplos na Legislação Penal (Suicídio, Prostituição, Drogas)

A legislação penal brasileira, em alguns casos, reflete o princípio do dano de Mill, enquanto em outros demonstra uma tendência ao paternalismo estatal.

  • Suicídio: O Código Penal não tipifica o suicídio como crime (autolesão), mas criminaliza condutas de "induzir", "instigar" ou "auxiliar" o suicídio (Art. 122). Mill compartilhava desse entendimento, pois aconselhar ou incitar alguém é um ato social, passível de controle social.

  • Prostituição: A prostituição em si não é tipificada como crime no Código Penal, em consonância com a lógica do princípio do dano: o profissional do sexo e seu cliente não produzem dano à sociedade. No entanto, crimes como "favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual" (induzir ou atrair para a prostituição, impedir abandono), "estabelecimentos em que ocorra a exploração sexual" (Art. 299), e "rufianismo" (tirar proveito da prostituição alheia, Art. 230) são criminalizados. Isso visa proteger a dignidade e a liberdade sexual do indivíduo, não a atividade em si. A crítica aqui é que, ao permitir a prostituição e não regularizar devidamente a atividade, cria-se uma situação perversa que expõe os profissionais a riscos.

  • Drogas: O consumo de entorpecentes é criminalizado pela Lei Federal n.º 11.343/2006 (Lei de Drogas), embora não preveja pena de prisão para o usuário (Art. 28), cujas penas são irrisórias e com efeito dissuasivo quase inexistente. A ilicitude é fundamentada na proteção da saúde pública, mas a lesão afeta principalmente o próprio consumidor. A política de repressão atual é criticada por ser um contrassenso, já que o Estado não oferece opção lícita de venda, deixando os consumidores à mercê do tráfico. Isso é comparado à proibição de bebidas alcoólicas criticada por Mill, que levou ao aumento do consumo ilegal e lucros para o tráfico. A repressão ao narcotráfico pode, paradoxalmente, levar ao fortalecimento de criminosos mais audazes e ao aumento da violência, pois reduz a oferta e eleva o preço, sem diminuir a demanda. Para muitos, consumir drogas é uma questão de liberdade individual, e o Estado não deveria impedir ações que não prejudicam outras pessoas.

A ascensão de uma tendência em que o Direito Penal é instituído como primeiro recurso para solução de problemas sociais (ultima ratio) é vista como um paternalismo penal que fere as liberdades individuais e a autonomia das vontades.

6 A Liberdade de Expressão na Era Digital

A revolução tecnológica e a popularização da internet trouxeram infinitas possibilidades para a evolução da humanidade, especialmente os mecanismos informacionais que permitem a conexão em rede e a comunicação em tempo real. No entanto, também apresentaram novos desafios para a liberdade de expressão.

6.1 Desafios da Internet: Desinformação e Fake News

A internet permitiu a realização plena do direito de expressar-se livremente e a livre circulação da informação, subvertendo a separação entre produtor e receptor, onde todos podem ser jornalistas e editores de conteúdo. No entanto, esse cenário também trouxe a proliferação de "notícias falsas" (fake news) e desinformação, capazes de disseminar boatos em larga escala e influenciar eleições.

A desinformação coloca em xeque a credibilidade da mídia e compromete o potencial do jornalismo de promover o debate. A polarização exacerbada no contexto brasileiro, muitas vezes, faz com que "ganhar o debate" pareça mais importante do que o debate em si, mesmo que isso se apoie em informações não verdadeiras.

6.2 Regulação do Ciberespaço: Mecanismos e Abordagens

Para proteger direitos efetivamente na internet, é necessária uma abordagem interdisciplinar para a regulação do ciberespaço. Tradicionalmente, o ciberespaço foi visto como um território livre e autorregulamentado. No entanto, a realidade atual exige a aplicação de mecanismos legais.

Lawrence Lessig propõe um modelo geral de regulação com quatro modalidades:

  • O Direito: Nem sempre é o mais eficiente, mas possui superioridade por poder modificar as características das outras modalidades.

  • As Normas Sociais: Regulam o comportamento na rede, equiparadas aos costumes ("netiqueta").

  • O Mercado: Regula o comportamento por meio da cobrança de serviços e liberação de acesso a conteúdo pago.

  • A Arquitetura: É a regulação da internet por meio de modificações em seu design. Tem o efeito mais imediato, podendo restringir comportamentos (e.g., proibir comentários, acesso de certas pessoas) e carregando valores nem sempre transparentes.

Ainda que a arquitetura seja eficaz, o Direito desempenha um papel fundamental ao estabelecer as determinações para as alterações necessárias na concepção da internet para tutelar interesses.

6.3 A Proteção da Privacidade da Mulher na Internet (Lei Carolina Dieckmann)

A privacidade das mulheres merece atenção especial, principalmente através de mecanismos jurídicos, devido ao histórico de discriminação e violência sofrido ao longo da história.

A Lei nº 12.737/2012, conhecida como Lei Carolina Dieckmann, alterou o Código Penal para tipificar crimes informáticos, como invasão de dispositivo informático e interrupção de serviço. Essa lei surgiu após o vazamento de fotos íntimas da atriz Carolina Dieckmann na internet. A promulgação dessa lei ressalta a necessidade de proteção especial à privacidade das mulheres no ambiente virtual, considerando que o processo de virtualização afeta toda a estrutura social, cultural e econômica, e as mulheres são desproporcionalmente vítimas de violações de privacidade nesse contexto.

É crucial que se abandone o critério binário "público ou privado", reconhecendo que a linha que os separa é muito tênue, e que nem sempre o que foi feito em público é realmente público.

6.4 O Papel dos Algoritmos e a Necessidade de Governança

Os algoritmos das plataformas digitais (como Facebook e Google) têm um imenso poder na definição da percepção da realidade e no comportamento dos usuários. Eles buscam a personalização do conteúdo, conectando usuários a informações que supostamente são mais relevantes, mas isso pode levar à criação de "bolhas discursivas", reforçando preconceitos e estimulando o ódio.

A alta opacidade dos algoritmos é uma preocupação, pois a forma como as informações são tratadas é segredo industrial. A governança dos algoritmos deve ser pensada a partir de princípios que garantam os direitos fundamentais dos usuários e os direitos coletivos da sociedade. Isso inclui:

  • Consentimento do usuário sobre a exposição ao algoritmo: Usuários devem ser informados de que estão expostos a softwares que filtram informações e que estão dentro de uma "bolha", para que possam decidir se querem permanecer nela.

  • Autonomia do usuário na parametrização do algoritmo: As ferramentas devem oferecer recursos para que o usuário possa decidir a que tipo de conteúdo quer ter acesso ou como quer que o algoritmo opere.

  • Transparência no tratamento de dados pessoais: Tornar público o rol de dados coletados para alimentar os algoritmos, permitindo ao usuário parametrizar o que quer oferecer.

6.5 Imprensa Livre e Diversidade de Vozes

A imprensa livre desempenha um papel especial como portadora do direito geral à liberdade de expressão para todos. No Brasil, a imprensa tem sido crucial para a verificação diária dos fatos e para desorganizar projetos autoritários. Sem imprensa livre, a sociedade perde parâmetros para diferenciar fatos de mentiras.

A diversidade de vozes, incluindo a imprensa negra e as iniciativas de grupos historicamente marginalizados, é fundamental para o fortalecimento da democracia e para a promoção de direitos. A popularização da internet e o uso de dispositivos móveis deram a esses grupos a possibilidade de criar narrativas e conteúdos, gerando novas referências e confrontando ideias de subalternização. A luta pela comunicação e expressão por parte de negros e negras no Brasil tem uma longa tradição e um papel importante na esfera pública.

É dever do Estado e da sociedade assegurar a diversidade e o pluralismo de vozes, reconhecendo que a liberdade de expressão desempenha um papel fundamental na proteção dos direitos de minorias e grupos historicamente marginalizados. A supressão de ideias, mesmo as incômodas, empobrece a discussão e põe em risco o progresso social.