
Compreender a Independência do Brasil vai muito além do famoso "Grito do Ipiranga" de 7 de setembro de 1822. Na verdade, foi um complexo e multifacetado processo histórico que se estendeu por anos, envolvendo intensas articulações políticas, disputas regionais e a persistência de estruturas sociais e econômicas herdadas do período colonial.
Para entender por que o Brasil se tornou independente, é fundamental olhar para as transformações que já vinham acontecendo no final do século XVIII e início do XIX. O sistema colonial português, embora ainda vigente, apresentava sinais claros de enfraquecimento.
Você já se perguntou se a ideia de independência surgiu do nada? Definitivamente não! Ao longo do século XVIII, e com mais intensidade no final dele, surgiram diversos movimentos de contestação ao domínio português, muitos influenciados pelas ideias iluministas de liberdade e autonomia que ecoavam da Europa e das Américas. Eles demonstravam um crescente sentimento nativista e emancipacionista.
Entre os mais conhecidos, destacam-se:
Inconfidência Mineira (1789): Uma revolta de caráter republicano e separatista, organizada por setores da capitania de Minas Gerais contra o poder colonial, impulsionada por questões políticas e econômicas, como a cobrança excessiva de impostos (o "quinto") em uma época de esgotamento das minas.
Conjuração Baiana (1798): Também conhecida como Revolta dos Alfaiates, foi um movimento de cunho popular e republicano que defendia o fim da escravidão, refletindo as tensões sociais da época.
Revolução Pernambucana (1817): Este foi um movimento singular, pois foi o único do período colonial que ultrapassou a fase conspiratória e chegou à tomada do poder. Com caráter liberal, federalista e republicano, eclodiu em Pernambuco devido a fatores como a influência iluminista, os enormes gastos da Família Real (que exigiam grandes somas de dinheiro de Pernambuco, a capitania mais lucrativa), a seca de 1816 e o atraso no pagamento de soldados. A república foi proclamada pela primeira vez em terras brasileiras durante este levante, que durou cerca de 75 dias. A repressão foi violenta, com execuções e a desmembramento da comarca das Alagoas do território pernambucano como retaliação.
Prioridade para Concursos: A Revolução Pernambucana é frequentemente cobrada por seu caráter republicano, por ter de fato tomado o poder, e por sua relação com os gastos da Corte.
Esses movimentos, embora reprimidos, foram precursores e mostraram que o desejo por autonomia e mudanças já fermentava em diversas regiões do Brasil.
A grande mudança que aceleraria o processo de independência veio de um evento inesperado na Europa: as Guerras Napoleônicas.
Bloqueio Continental (1806): Napoleão Bonaparte, imperador da França, decretou o Bloqueio Continental para enfraquecer a Inglaterra economicamente, proibindo as nações europeias de comercializar com ela.
A Fuga da Família Real (1807): Portugal, antigo aliado da Inglaterra, encontrava-se em uma posição difícil. Para evitar a invasão francesa e a perda do trono, D. João VI (então Príncipe Regente) decidiu transferir a Corte portuguesa para o Brasil. Essa decisão, apoiada pela Inglaterra, garantiu a continuidade da soberania portuguesa e o acesso inglês ao mercado brasileiro. Estima-se que entre 10 e 15 mil pessoas da Corte se mudaram, trazendo consigo a estrutura de poder, obras de arte e recursos.
A chegada da Família Real ao Rio de Janeiro em 1808 marcou o início do Período Joanino (1808-1821) e representou uma "inversão metropolitana". O Brasil deixou de ser uma mera colônia e passou a funcionar como a sede administrativa do Império Português. Isso gerou profundas transformações no Brasil, que visavam modernizar o país e dar suporte à Corte.
Entre as medidas mais impactantes, destacam-se:
Abertura dos Portos às Nações Amigas (1808): Uma das primeiras e mais importantes ações de D. João VI, que pôs fim ao monopólio comercial português (o "Exclusivo Metropolitano" ou "Pacto Colonial"). Isso beneficiou a Inglaterra, que tinha melhores condições de comércio, e agradou à elite econômica brasileira, que desejava mais liberdade comercial.
Tratado de Comércio e Navegação (1810): Reforçou os privilégios comerciais ingleses, estabelecendo tarifas alfandegárias mais baixas para produtos britânicos.
Criação de Instituições: Foram fundadas escolas (como a Escola de Cirurgia da Bahia), museus, bibliotecas, o Banco do Brasil e a Imprensa Régia, que publicava o primeiro jornal brasileiro, A Gazeta do Rio de Janeiro. Embora houvesse progresso e desenvolvimento intelectual, a imprensa sofria censura, e as publicações contra o governo ou o catolicismo não eram permitidas.
Elevação do Brasil a Reino Unido (1815): Para D. João VI garantir sua participação no Congresso de Viena e o reconhecimento da dinastia de Bragança após a derrota de Napoleão, o Brasil foi elevado à condição de Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Essa medida, além de elevar o status político do Brasil, tinha como objetivo evitar a fragmentação revolucionária que havia ocorrido com os EUA.
Dúvida Comum: Qual a importância da vinda da Família Real? Ela acelerou o processo de independência ao "descolonizar" o Brasil internamente, abrindo os portos e criando uma infraestrutura estatal, mas também gerou insatisfações que impulsionaram o desejo de autonomia.
Apesar das melhorias e do novo status, o descontentamento no Brasil continuava, impulsionado pelas ideias liberais e pela tensão com Portugal.
Com o fim das Guerras Napoleônicas e a estabilização na Europa, Portugal vivia uma grave crise econômica e política. A burguesia portuguesa, insatisfeita e inspirada pelos ideais liberais, iniciou a Revolução Liberal do Porto em 1820. Os principais objetivos eram:
Derrubar a administração inglesa em Portugal e elaborar uma Constituição.
Exigir o retorno de D. João VI a Portugal.
Recolonizar o Brasil, ou seja, restaurar o monopólio comercial e rebaixar o Brasil à condição de colônia.
Pressionado, D. João VI retornou a Portugal em abril de 1821, levando consigo grande parte do ouro e diamantes do Banco do Brasil. No Brasil, ele deixou seu filho mais velho e herdeiro, D. Pedro de Alcântara, como Príncipe Regente.
A partir de 1821, as Cortes portuguesas em Lisboa (a Assembleia Constituinte de Portugal) passaram a emitir decretos que visavam reduzir a autonomia do Brasil e, na prática, fazê-lo retornar à condição colonial. Eles exigiam o retorno imediato de D. Pedro a Portugal, a transferência de importantes instituições criadas no Brasil de volta para Lisboa, e consideravam o Príncipe Regente apenas um "governador de armas" da província do Rio de Janeiro.
Essa intransigência gerou grande insatisfação e reforçou a ideia de separação no Brasil. Grupos políticos se formaram em torno de D. Pedro, buscando a autonomia do Brasil.
Dia do Fico (9 de janeiro de 1822): Diante das crescentes pressões das Cortes para seu retorno, D. Pedro recebeu um abaixo-assinado com milhares de assinaturas solicitando sua permanência no Brasil. Sua resposta, que se tornou célebre (embora a veracidade exata das palavras seja questionada pelos historiadores): "Se é para o bem de todos e felicidade geral da Nação, estou pronto. Diga ao povo que fico". Essa decisão foi um passo crucial e simbólico para a independência, evitando o retrocesso à condição de colônia.
Prioridade para Concursos: O Dia do Fico é um marco fundamental. Importante notar que, naquele momento, muitos ainda desejavam manter o vínculo com Portugal, mas com maior autonomia.
O "Cumpra-se" (Maio de 1822): D. Pedro decretou que nenhuma lei ou ordem vinda de Portugal teria validade no Brasil sem seu aval prévio. Essa medida reforçou a autoridade do Príncipe Regente e a progressiva separação.
Convocação da Assembleia Constituinte (Junho de 1822): D. Pedro convocou eleições para a formação de uma Assembleia Constituinte brasileira, um passo claro na direção da autonomia legislativa do país.
O Papel de Maria Leopoldina: A Imperatriz, com vasto conhecimento em ciências, línguas e administração, foi uma figura-chave no processo de independência. Em 2 de setembro de 1822, na ausência de D. Pedro (que estava em viagem a São Paulo), ela presidiu uma sessão extraordinária do Conselho de Estado. Após a leitura de novas e intransigentes ordens de Lisboa que exigiam o retorno imediato de D. Pedro e acusavam seus ministros de traição, Leopoldina e os ministros decidiram pela separação definitiva de Portugal, assinando uma declaração de independência. Ela enviou um mensageiro (Paulo Bregaro) para entregar a notícia a D. Pedro.
Prioridade para Concursos: A atuação de Maria Leopoldina é um ponto relevante, pois desmistifica a ideia de que a independência foi um ato exclusivo de D. Pedro I. Sua decisão antecipou e solidificou o rompimento.
O Grito do Ipiranga (7 de setembro de 1822): Ao receber a carta de Leopoldina e José Bonifácio às margens do riacho Ipiranga, em São Paulo, D. Pedro teria proferido a famosa frase "Independência ou Morte!", rompendo oficialmente os laços com Portugal. Este evento é considerado o marco simbólico da Independência do Brasil.
Dúvida Comum: O "Grito" realmente aconteceu como é retratado na pintura de Pedro Américo? A historiografia atual questiona a veracidade literal do evento. A imagem heroica e centralizada em D. Pedro I, popularizada pela pintura "Independência ou Morte" (1888) de Pedro Américo, é vista como uma construção posterior, um "mito" criado para forjar um sentimento de nacionalidade e legitimar a figura do monarca. A realidade provavelmente foi menos teatral e mais fruto de um processo contínuo de decisões políticas e pressões.
A notícia da independência se espalhou, e em 12 de outubro de 1822 (aniversário de D. Pedro), ele foi aclamado Pedro I, Imperador Constitucional e Defensor Perpétuo do Brasil. A escolha do título de "imperador" em vez de "rei" visava simbolizar uma nova ordem, não apenas a continuidade dinástica portuguesa, e a aclamação popular. Sua coroação ocorreu em 1º de dezembro de 1822.
A Independência do Brasil, embora um marco fundamental, não resultou em uma ruptura total com as estruturas coloniais e as hierarquias sociais. Ela foi, em muitos aspectos, uma independência "conservadora".
Ao contrário do que a narrativa romântica pode sugerir, a independência não foi um processo pacífico em todo o território. Houve resistência de tropas portuguesas e de grupos que se mantiveram leais à metrópole, levando a conflitos armados em diversas províncias.
As principais frentes de resistência ocorreram nas províncias de:
Bahia: Cenário de intensas batalhas, envolvendo figuras como Maria Quitéria de Jesus. A independência na Bahia só foi consolidada em 2 de julho de 1823.
Pará e Maranhão: Regiões com forte presença de tropas portuguesas, onde também ocorreram combates. A "Adesão do Pará" ao Império independente ocorreu após sufocamento de tropas portuguesas.
Cisplatina (atual Uruguai): Província invadida por D. João VI anteriormente, que se tornou palco de conflitos e que, mais tarde, conquistaria sua própria independência do Brasil.
Para conter essas revoltas e formar um exército, D. Pedro I precisou contratar mercenários e solicitar empréstimos à Inglaterra. A guerra de independência brasileira teve um número de combatentes maior do que as guerras de libertação da América Espanhola, com uma estimativa de 2.000 a 3.000 mortos.
O reconhecimento da independência por Portugal veio apenas em 1825, com a assinatura do Tratado de Paz e Aliança. Em troca, o Brasil se comprometeu a pagar uma indenização de dois milhões de libras esterlinas a Portugal. Para isso, o Brasil novamente recorreu a empréstimos com a Inglaterra, que mediou as negociações interessada em privilégios comerciais.
Prioridade para Concursos: O endividamento do Brasil com a Inglaterra logo no início de sua vida independente é um ponto crucial, pois marcou o início de uma dependência econômica.
Quanto ao reconhecimento por outros países, por décadas acreditou-se que os Estados Unidos foram os primeiros a reconhecer formalmente em 1824, impulsionados pela Doutrina Monroe. No entanto, estudos mais recentes sugerem que o primeiro país a reconhecer o Brasil pode ter sido o Reino do Daomé (na África Ocidental), ou as Províncias Unidas do Rio da Prata (atual Argentina). Outros países americanos, recém-independentes e republicanos, tinham resistência ao regime monárquico e às tendências absolutistas de D. Pedro I.
Apesar dos ideais liberais que circulavam, a independência brasileira não promoveu grandes rupturas sociais. Ao contrário do que muitos esperavam, o Brasil optou por uma monarquia (sendo a única no continente, junto com a haitiana e mexicana, no período pós-independência das Américas).
Um dos maiores legados da colonialidade foi a manutenção da escravidão, que só seria legalmente abolida em 1888. Escravizados e indígenas, grupos historicamente marginalizados, continuaram sem maiores direitos e participação política.
A Noção de Cidadania: A cidadania no Brasil imperial era extremamente restrita e hierarquizada. José Murilo de Carvalho (2002) define cidadania em três dimensões: direitos civis (liberdade, propriedade, igualdade perante a lei), direitos políticos (participação no governo, voto) e direitos sociais (educação, trabalho, saúde). No Brasil do século XIX, os escravos estavam totalmente excluídos de todas essas dimensões. Mesmo os "homens livres da ordem escravocrata" e os brancos pobres não eram plenamente contemplados.
A Constituição de 1824, outorgada por D. Pedro I após fechar a Assembleia Constituinte de 1823, estabeleceu uma cidadania vinculada à nacionalidade, mas com base na propriedade e renda. Havia a distinção entre:
Cidadania Ativa: Reservada aos cidadãos-proprietários, com direito a voto e a cargos públicos.
Cidadania Passiva: Para os brasileiros pobres, que eram súditos de direitos, mas não de direitos políticos, considerados politicamente inaptos.
Grande parte da população, incluindo "arraia miúda" (pobres), negros escravizados e ex-escravizados, e trabalhadores urbanos, tinha acesso parcial ou nenhum acesso à cidadania. A "boa sociedade" detinha os atributos para o governo.
Colonialidade e Racismo como Pilares: O processo de formação do Estado brasileiro se deu em conjunto com a criação de uma classe dirigente e a expansão de uma civilização. No entanto, os preceitos colonialistas, como o racismo, não foram abandonados. A noção de colonialidade é fundamental para entender esse período.
A colonialidade é a face da modernidade europeia que cabe aos colonizados, um padrão de poder que emerge da relação colonial e persiste mesmo após os processos de independência. Ela se manifesta em eixos de poder como a ideia de raça e a naturalização de uma relação de inferioridade, além de uma estrutura de trabalho baseada em servidão e escravidão.
Essa ideia de raça levou à hierarquização de povos e lugares, culminando em uma noção muito restrita de cidadania. Argumentos racistas foram utilizados para excluir indígenas, negros e mestiços, ou seja, a maioria da população brasileira.
Dehumanização e "Não-Ser": Maldonado Torres (2007) argumenta que a ideia de raça permitiu a substituição da noção de "Outro" pela noção de "não-ser". Isso se manifestou na classificação das pessoas em graus de humanidade, onde "quanto mais branca a pele, mais próximo o sujeito estaria de representar uma humanidade completa – e, consequentemente, estar apto à cidadania".
Prioridade para Concursos: O conceito de colonialidade, a persistência do racismo e a exclusão da maioria da população (indígenas, negros, pobres) da cidadania são pontos essenciais para uma análise crítica da independência.
O Tratamento Indígena: Embora a humanidade dos povos indígenas não fosse oficialmente contestada (para justificar uma unidade populacional), na prática, a noção do indígena "selvagem, bestial e feroz" justificava violências e expropriações de terra. A política de assimilação (Diretório Pombalino) e a prática de "guerra justa" (invocada por D. João VI no século XIX) para tomar terras de indígenas "insubmissos" e "inaptos ao processo civilizatório" demonstram a persistência da violência colonial.
Apesar da proclamação da independência, o Brasil ainda precisava consolidar sua unidade territorial e um sentimento geral de pertencimento. Havia regiões com identidades específicas, forjadas por séculos de domínio colonial.
Regionalismos: Algumas regiões tinham laços mais estreitos com Portugal ou com o continente africano. Deputados da Bahia, Pernambuco, Pará e Maranhão buscavam diminuir a drenagem de recursos para o Rio de Janeiro. Pernambuco, por exemplo, resistia a uma ideia de unidade construída a partir do sul, mantendo sua autonomia e um circuito comercial e político independente do Rio de Janeiro.
Identidade Fragmentada: Jancsó (2003) afirma ser um equívoco reduzir a formação do Estado brasileiro à ruptura com Portugal. Um pernambucano, por exemplo, tinha Pernambuco como pátria, Brasil como país e Portugal como nação. O termo "brasileiro" não era amplamente identificado pelos naturais da terra, e a escravidão era um fator central na organização social.
Criação de um "Mito Nacional": O Império buscou forjar uma unidade através da criação de um mito nacional, utilizando datas comemorativas (como o 7 de abril, data da abdicação de D. Pedro I, comparada ao 7 de setembro), a recunhagem da moeda e a imposição da língua portuguesa.
A população não foi inerte a esse processo de exclusão. A cidadania se construiu no cotidiano, através de levantes, resistências e lutas por direitos, inclusão e reconhecimento.
Politização das Ruas: A imprensa, recém-criada, e os grupos políticos de oposição (liberais moderados e exaltados) difundiram ideias de autonomia e liberdade. Isso levou à "politização das ruas", com a revitalização de espaços de sociabilidade política, mobilização da opinião pública e intensa participação popular.
Petições à Câmara: Mesmo após o fechamento da Assembleia Geral, a Constituição de 1824 garantia o direito de petição. Essas petições eram vistas como uma ponte entre o código e o cotidiano, ajudando a construir a imagem da Câmara como defensora do cidadão.
Manifestações e Revoltas Urbanas e Rurais:
A população livre pobre, ao se encaixar nos requisitos básicos de cidadania (nacionalidade brasileira, não-escravo), buscava usufruir dos novos direitos.
Havia um receio constante entre as elites de grandes rebeliões de escravizados, especialmente no Rio de Janeiro (maior cidade escravista das Américas), alimentado por exemplos como a Revolta de São Domingos (Haiti) e a Revolta dos Malês (1835).
A "Noite das Garrafadas" (março de 1831), um confronto entre defensores e críticos de D. Pedro I nas ruas do Rio de Janeiro, demonstra a tensão da época e contribuiu para a abdicação do imperador. Os manifestantes eram frequentemente descritos como de "baixa condição social," "negros e pardos da ínfima classe".
Lutas Contra-Colonialistas e Abolicionismo: A formação de quilombos em todo o território nacional foi uma forma contundente de resistência dos escravizados. O movimento abolicionista, um dos maiores do final do século XIX, articulou diferentes grupos sociais em torno do direito à liberdade. As lutas abolicionistas formaram uma identidade e experiência para lutas posteriores.
Resistência Indígena: Apesar da tutela governamental, os povos indígenas resistiram ativamente, com conflitos locais violentos e tentativas de recorrer às vias oficiais contra abusos, como as denúncias dos Xucurus de Pernambuco em 1825.
Algumas figuras tiveram papéis centrais, e é importante entender suas complexidades:
D. Pedro I (Pedro de Alcântara Francisco Antônio João Carlos Xavier de Paula Miguel Rafael Joaquim José Gonzaga Pascoal Cipriano Serafim de Bragança e Bourbon): Herdeiro da casa real portuguesa, transformado no primeiro imperador do Brasil. Seu protagonismo político na Independência é inegável. No entanto, seu autoritarismo e intransigência marcaram o Primeiro Reinado. Ele fechou a Assembleia Constituinte de 1823 e outorgou a Constituição de 1824, que protegia a escravidão. Sua popularidade declinou devido à Guerra da Cisplatina e ao assassinato do jornalista Líbero Badaró, levando à sua abdicação em 7 de abril de 1831. Ele retornou a Portugal para lutar pelo trono de sua filha.
Prioridade para Concursos: Entender que D. Pedro I foi o protagonista, mas também um líder autoritário que limitou a participação política, é fundamental.
José Bonifácio de Andrada e Silva: Conhecido como o "Patriarca da Independência". Inicialmente, ele defendia a manutenção dos vínculos com Portugal, mas com autonomia brasileira. Convencido da necessidade de rompimento, tornou-se o principal ideólogo da independência política. No entanto, sua visão era conservadora e centralizadora, pregando a independência sem mudança de regime (sem república ou abolição da escravatura). Ele foi o mentor de periódicos que defendiam a manutenção do Brasil em um reinado.
Maria Leopoldina de Habsburgo-Lorena: Como já detalhado, sua decisão de assinar a declaração de independência em 2 de setembro de 1822 foi crucial e muitas vezes subestimada na narrativa oficial. Ela representa a agência feminina e a complexidade das relações de poder na Corte.
Joaquim Gonçalves Ledo: Uma figura liberal e maçônica, que atuava em jornais e lojas maçônicas, criticando o colonialismo e defendendo a separação total da metrópole. Ele desenvolveu um jornal independente, o Revérbero Constitucional Fluminense, que incentivava a Assembleia Constituinte. Ele e José Bonifácio, ambos maçons, representavam as duas principais correntes ideológicas (liberal radical vs. conservadora absolutista) que influenciavam D. Pedro I no processo de independência.
A Maçonaria: As ideias liberais e progressistas da Maçonaria, que pregam a liberdade de pensamento, igualdade de direitos e fraternidade social, estiveram presentes nos conflitos e eventos que levaram à Independência. Lojas maçônicas funcionavam, por vezes clandestinamente, como espaços de liberdade de pensamento e acesso à bibliografia política e filosófica, em uma época de censura. Na ausência de partidos políticos, a Maçonaria agiu como um verdadeiro partido político da Independência, com muitos de seus membros jurando realizar a independência do Brasil ao ingressar na ordem.
O processo de independência, que culminou no Império do Brasil, foi um período de modernização que, contudo, manteve a estrutura de privilégios já estabelecida. A cidadania, como ideal de inclusão, não se tornou completa.
República Velha e a Exclusão Persistente: Mesmo após a Proclamação da República em 1889, a Constituição de 1891 continuaria a excluir grande parte da população do direito ao voto (analfabetos, mulheres, sem-teto, soldados, membros de ordens religiosas), caracterizando um "liberalismo excludente".
Símbolos Nacionais: Novos símbolos surgiram na República, como Tiradentes, e instituições como o IHGB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro), que já no Império produzia uma visão elitista da história e exclua o negro da nacionalidade, se adaptaram à nova realidade.
Continuidade das Lutas: Nas cidades e no campo, os excluídos continuaram a se levantar em movimentos sociais. Antonio Bispo dos Santos (2019) ressalta que o Estado brasileiro, desde sua fundação até hoje, tem atuado como inimigo de povos e comunidades tradicionais, como quilombolas e indígenas, além da população mais pobre e vulnerável. No entanto, essas comunidades persistem em reivindicar seus direitos, seja por meios legais ou outras formas de resistência.
A análise da Independência do Brasil sob a luz dos estudos decoloniais revela que a modernidade brasileira foi construída a partir de uma colonialidade persistente, onde a hierarquização racial e a exclusão foram pilares fundamentais. O Estado buscou forjar uma noção de cidadania supostamente homogênea, negando as diferenças e hierarquias que ele mesmo criava.
É crucial entender que o 7 de setembro de 1822 foi um momento simbólico de ruptura política, mas a verdadeira construção de uma nação brasileira inclusiva e de uma cidadania plena é um caminho longo e inacabado, que se estende até os dias atuais. Ao estudar este período, reflita sobre as complexidades, as vozes silenciadas e as permanências, para ter uma compreensão mais completa e crítica da nossa história. A independência não foi um evento isolado, mas o ápice de um processo e o início de outro, que ainda hoje desafia a sociedade brasileira.
Questões:
Quem proclamou a independência do Brasil às margens do rio Ipiranga? a) Dom João VI
b) Dom Pedro II
c) Dom Pedro I
d) Dom Manuel I
Qual foi o modelo de governo estabelecido pela constituição de 1824 após a proclamação da independência? a) Monarquia absolutista
b) Monarquia parlamentarista
c) Monarquia constitucional
d) República presidencialista
Qual grupo assumiu o controle do Brasil após a independência, implementando políticas que favoreciam seus interesses? a) Escravos alforriados
b) Elite brasileira
c) Governantes portugueses
d) Líderes religiosos
Gabarito:
c) Dom Pedro I
c) Monarquia constitucional
b) Elite brasileira