
O corpo humano é uma máquina complexa, e uma de suas capacidades mais notáveis é o movimento [37a]. Seja para andar, correr, respirar, bombear sangue ou digerir alimentos, os músculos estão sempre em ação [37a, 37d, 64]. Eles são estruturas individualizadas que se conectam a uma ou mais articulações e, ao se contraírem, são capazes de gerar movimento. As células musculares são verdadeiras usinas de energia, transformando energia química em energia mecânica.
A capacidade dos músculos de gerar tensão é o que entendemos por contração muscular. Para que esse processo complexo aconteça, uma série de regulações químicas são indispensáveis. A farmacologia, por exemplo, estuda a fundo as diversas substâncias orgânicas que permitem o funcionamento do corpo humano.
Para começar a entender o sistema muscular, é fundamental conhecer os três tipos de tecido muscular presentes em nosso corpo, cada um com características morfológicas, funcionais e de controle distintas:
Músculo Liso (ML) [36a, 47, 55, 64]:
Localização: Principalmente nas paredes da maioria das vísceras ocas, como estômago, intestino, bexiga urinária, vasos sanguíneos, trato gastrointestinal e vasos sanguíneos [36a, 56, 64, 99].
Morfologia: É formado por células longas e fusiformes, com um único núcleo elíptico e não possuem estriações transversais. O nome "liso" vem justamente da ausência dessas estriações.
Contração: É um processo lento e involuntário. Seu controle é feito pelo sistema nervoso autônomo, hormônios e fatores teciduais locais.
Função: Regula o volume de órgãos, impede a saída de conteúdo de órgãos ocos (esfíncteres), e move substâncias dentro do corpo, como alimentos (peristalse) [37c, 37d, 64, 99].
Capacidade Regenerativa: Apresenta a resposta regenerativa mais eficiente entre os tipos musculares; em caso de lesão, os leiomiócitos (células musculares lisas) podem entrar em mitose para reparar o tecido.
Exceção: Há dois tipos básicos de músculo liso: unitário (sincicial ou visceral), onde as células se comunicam por junções abertas e funcionam como uma unidade; e multiunitário, onde cada célula funciona independentemente.
Músculo Estriado Cardíaco (MEC) [36b, 47, 53, 63]:
Localização: Exclusivamente no coração (miocárdio) [36b, 63].
Morfologia: Composto por células alongadas e ramificadas, que apresentam estriações transversais (assim como o esquelético) [36b, 53]. Possuem um ou dois núcleos localizados no centro da fibra. Uma característica distintiva são os discos intercalares, que unem as fibras e transmitem sinais para a sincronização da contração cardíaca.
Contração: É involuntária, vigorosa e rítmica. Essa ritmicidade confere o batimento cardíaco adequado. O sistema gerador de impulsos é formado por células musculares cardíacas modificadas que produzem e conduzem o estímulo elétrico.
Capacidade Regenerativa: Os miócitos cardíacos não se regeneram.
Músculo Estriado Esquelético (MEE) [36c, 47, 48, 63]:
Localização: Preso aos ossos do esqueleto [36c, 63].
Morfologia: É o tecido muscular mais comum, formado por feixes de células cilíndricas muito longas e multinucleadas, que apresentam estriações transversais (devido ao arranjo das miofibrilas no sarcômero) [36b, 48, 51, 63, 84]. Seus numerosos núcleos localizam-se na periferia das fibras.
Contração: Possuem contração rápida e vigorosa e são, na maioria das vezes, controlados por nossa vontade (voluntários) [36c, 48, 65, 88]. É responsável pela locomoção e por todos os movimentos corporais globais, como andar e correr [37a, 48].
Funções Adicionais: Estabilização das posições corporais (manter-se em pé ou sentado), promoção do fluxo de linfa e retorno do sangue ao coração, e produção de calor para a manutenção da temperatura corporal [37b, 37d, 37e].
Capacidade Regenerativa: Possui uma pequena capacidade de reconstituição, pois os núcleos das fibras não se dividem.
Exceção Importante: Embora sejam predominantemente voluntários, os músculos esqueléticos também podem contrair-se sem interferência consciente em algumas situações, sendo influenciados por neurônios motores somáticos.
Para entender como a contração muscular acontece, precisamos “dissecar” o músculo esquelético e conhecer sua organização interna, que vai do nível macroscópico ao molecular.
2.1. Organização Estrutural do Músculo Esquelético: Um músculo esquelético é composto por muitos fascículos musculares. Cada fascículo, por sua vez, é formado por muitas fibras musculares (ou células musculares). Dentro de cada fibra muscular, há inúmeras miofibrilas, e cada miofibrila é composta por muitos miofilamentos.
Para garantir que a força de contração se espalhe por todo o feixe muscular e para outras estruturas como tendões e ossos, o músculo esquelético é envolto por um complexo sistema de tecido conjuntivo:
Epimísio: A camada mais externa de tecido conjuntivo, que circunda todo o músculo [42c, 49].
Perimísio: Envolve grupos de 10 a 100 ou mais fibras musculares individuais, separando-as em feixes chamados fascículos. Os fascículos podem ser vistos a olho nu [42d, 49].
Endomísio: Um fino revestimento de tecido conjuntivo que penetra no interior de cada fascículo, separando as fibras musculares individuais [42e, 49]. Vasos sanguíneos, linfáticos e nervos penetram no tecido através desses septos de tecido conjuntivo.
Fáscia Muscular: Uma lâmina larga de tecido conjuntivo fibroso que circunda os músculos e outros órgãos abaixo da pele [42b].
2.2. A Fibra Muscular: Uma Célula Altamente Especializada A fibra muscular (célula muscular) possui componentes com nomes especiais:
Sarcolema: A membrana celular mais externa da fibra muscular.
Sarcoplasma: O citoplasma da célula muscular. Nele, encontramos um grande número de mitocôndrias (as "usinas de energia" da célula), vários núcleos, e muitas miofibrilas.
Retículo Sarcoplasmático: Uma rede especializada de retículo endoplasmático liso dentro das células musculares. Sua função primordial é armazenar e regular o fluxo de íons cálcio (Ca²⁺) dentro da célula muscular.
Túbulos Transversos (T-Túbulos): Invaginações do sarcolema que se estendem para o interior da fibra, levando o impulso nervoso para as regiões mais profundas da célula.
2.3. O Sarcômero: A Unidade Contratil Fundamental As estriações das miofibrilas são resultado da organização em sarcômeros. O sarcômero é a unidade contrátil fundamental da miofibrila, onde o músculo apresentará o encurtamento, ou seja, onde ocorrerá a contração muscular.
Ao microscópio, o sarcômero exibe um padrão alternado de faixas claras e escuras, delimitado por duas estruturas proteicas em ziguezague chamadas Discos Z. Os principais componentes do sarcômero incluem:
Banda I: A região mais clara do sarcômero, composta exclusivamente por filamentos finos e atravessada pelo Disco Z.
Banda A: A banda mais escura do sarcômero, que abrange todo o comprimento dos filamentos grossos de miosina, com sobreposição dos filamentos finos nas porções laterais.
Zona H: Uma área central mais clara dentro da Banda A, ocupada apenas por filamentos grossos.
Linha M: A linha que divide a Zona H, onde proteínas ancoram os filamentos grossos, semelhante ao Disco Z para os filamentos finos.
Dentro do sarcômero, encontramos os miofilamentos, que são as proteínas contráteis essenciais para a contração:
Filamentos Finos (Actina): Partem da Linha Z. São formados por três tipos de proteínas: actina, tropomiosina e troponina.
A actina tem duas formas: globular (actina G) e filamentosa (actina F), sendo duas cadeias de actina F enroladas em hélice.
A tropomiosina é uma fita que se entrelaça nos sulcos da actina F, cobrindo os sítios de interação com a miosina na ausência de Ca²⁺.
A troponina é um complexo de três subunidades que se prende ao conjunto: Troponina I (afinidade por actina), Troponina T (afinidade por tropomiosina) e Troponina C (afinidade por Ca²⁺).
Filamentos Grossos (Miosina): Ocupam a região central do sarcômero. Cada filamento grosso é formado por cerca de 200 moléculas de miosina, que possuem uma cauda e duas cabeças globulares. As cabeças da miosina são cruciais, pois possuem um sítio de ligação com a actina e um sítio de fixação e hidrólise de ATP.
A contração muscular é um processo complexo que ocorre pelo deslizamento dos filamentos de actina sobre os filamentos de miosina. Esse mecanismo, conhecido como Teoria do Deslizamento dos Filamentos, é o cerne da fisiologia muscular.
3.1. O Início da Contração: Do Nervo ao Músculo
Estímulo Nervoso: Tudo começa com um impulso nervoso (potencial de ação) que percorre um neurônio motor somático até suas terminações nas fibras musculares.
Liberação de Neurotransmissores: Na junção neuromuscular (onde o neurônio se comunica com a fibra muscular), o neurônio libera acetilcolina.
Despolarização da Membrana: A acetilcolina se liga a receptores específicos na membrana da fibra muscular (placa motora), o que provoca a abertura de canais de cátions e a entrada de íons sódio (Na⁺) na célula. Isso gera uma despolarização local que se propaga por todo o sarcolema, incluindo os túbulos T.
Liberação de Cálcio: A despolarização que atinge os túbulos T sinaliza o retículo sarcoplasmático (rico em Ca²⁺) para abrir seus canais de cálcio. Isso resulta na liberação passiva de grandes quantidades de íons cálcio (Ca²⁺) no sarcoplasma.
3.2. O Papel Central do Cálcio e do ATP na Interação Actina-Miosina: O cálcio é de extrema importância e essencial para a contração muscular. Sem ele, a contração nas fibras musculares não seria possível, e o músculo permaneceria em estado de relaxamento.
Com a chegada do Ca²⁺ no sarcoplasma, a sequência de eventos contráteis se inicia:
Ligação do Cálcio: Os íons Ca²⁺ se ligam à subunidade Troponina C no filamento fino.
Exposição dos Sítios de Ligação: Essa ligação provoca uma mudança de conformação na troponina, que por sua vez traciona a tropomiosina. Isso faz com que a tropomiosina saia da frente, expondo os sítios de ligação da miosina na actina.
Formação das Pontes Cruzadas: As cabeças da miosina, que já estão energizadas pela hidrólise de ATP (transformação de ATP em ADP + fosfato inorgânico), podem então se ligar aos sítios expostos na actina, formando as chamadas pontes cruzadas.
Golpe de Força (Power Stroke): A liberação do fosfato inorgânico da cabeça da miosina provoca um movimento de pivô da cabeça da miosina em direção ao centro do sarcômero, arrastando o filamento fino de actina consigo. Isso causa o deslizamento e a sobreposição dos filamentos contráteis.
Desprendimento da Ponte Cruzada: Uma nova molécula de ATP se liga à cabeça da miosina, promovendo a dissolução da ponte cruzada. Sem o ATP, as pontes cruzadas ficariam presas, mantendo a contração.
Re-engatilhamento da Miosina: O ATP é hidrolisado (quebrado), "re-engatilhando" a cabeça da miosina para um novo ciclo de ligação e deslizamento.
Esse ciclo de ligação, golpe de força e desprendimento continua enquanto houver Ca²⁺ disponível no sarcoplasma e ATP para energizar as cabeças de miosina. O resultado é o encurtamento do sarcômero e, consequentemente, a contração muscular.
3.3. O Relaxamento Muscular: Descontinuação da Contração O relaxamento muscular ocorre como resultado da ausência ou diminuição do íon cálcio (Ca²⁺) no citoplasma celular.
Descontinuação do Impulso Nervoso: Com a descontinuação do impulso nervoso, ocorre a repolarização da unidade motora.
Recaptura de Cálcio: O retículo sarcoplasmático, através de uma bomba de cálcio, transporta ativamente os íons Ca²⁺ de volta para suas cisternas (locais de armazenamento).
Cessação da Interação: A remoção do Ca²⁺ do sarcoplasma faz com que a troponina e a tropomiosina retornem à sua posição original, cobrindo os sítios de ligação da miosina na actina.
Retorno ao Repouso: Isso cessa a atividade contrátil do músculo, permitindo seu retorno ao estado inicial de repouso.
3.4. De Onde Vem a Energia (ATP) para a Contração? A contração e o relaxamento muscular exigem um fornecimento constante de ATP (Adenosina Trifosfato). As células musculares obtêm ATP de várias maneiras:
Respiração Aeróbica: A principal forma de produzir ATP em presença de oxigênio, sendo altamente eficiente (produz cerca de 36 ATPs).
Glicólise (Respiração Anaeróbica): Na ausência de oxigênio, as fibras musculares podem obter ATP através da glicólise, que é menos eficiente (2 ATPs), mas muito mais rápida. Algumas fibras musculares, as fibras rápidas, "preferem" essa via mesmo com oxigênio, permitindo uma resposta contrátil veloz.
Fosfocreatina: Uma forma rápida de armazenar e disponibilizar ATP. Em repouso, o ATP doa um fosfato inorgânico para a creatina, formando fosfocreatina. Quando o músculo começa a contrair e precisa de energia imediata, a fosfocreatina doa esse fosfato de volta para o ADP, que se transforma rapidamente em ATP.
A contração muscular não é um evento "tudo ou nada". Sua força e duração podem ser moduladas de diversas formas.
4.1. Unidade Motora: Uma unidade motora é o conjunto formado por um neurônio motor e todas as fibras musculares que esse neurônio inerva. Cada músculo contém várias unidades motoras.
A força de contração de um músculo pode ser aumentada de duas maneiras (o que chamamos de somação):
Somação por Fibras Múltiplas: Quanto maior o número de unidades motoras recrutadas e contraindo simultaneamente, maior será a força da contração.
Somação por Frequência: Quanto maior a frequência de potenciais de ação (abalos musculares) em uma unidade motora, maior a força da contração, pois um estímulo se inicia antes do término do anterior.
4.2. Tipos de Contração Muscular em Relação ao Movimento e Tensão (Muito Cobrado!): Além do mecanismo molecular, os músculos podem se contrair de diferentes formas em relação à alteração de seu comprimento e à tensão gerada:
Contração Isométrica (Estática):
Significado: "Iso" = igual, "métrica" = medida/comprimento.
Característica: O músculo desenvolve tensão (força), mas não há alteração em seu comprimento externo ou no ângulo da articulação. A energia normalmente usada para trabalho mecânico externo é usada no rearranjo estrutural das fibras, e parte se dissipa em calor.
Quando Ocorre: Quando o torque de resistência de uma articulação é igual ao torque de força produzido pelo músculo, ou quando a resistência contra a qual o músculo exerce tensão é igual à tensão máxima que ele pode produzir.
Exemplos: Sustentar um objeto em uma posição fixa no ar, manter a postura. Se você parar no meio de um movimento de extensão do quadril, sustentando o peso, isso é uma contração isométrica.
Implicações Hemodinâmicas: Pode provocar um aumento da pressão arterial, pois o músculo contraído comprime os vasos e diminui seu calibre, aumentando a resistência vascular periférica.
Benefícios e Limitações: Pode levar a ganho de força moderado e é amplamente usado em reabilitação e para indivíduos descondicionados. No entanto, sua transferência para as atividades diárias (que envolvem movimentos) é baixa, e a hipertrofia muscular é limitada ao ângulo articular em que o músculo é sobrecarregado.
Contração Isotônica (Dinâmica):
Significado: "Iso" = igual, "tônica" = tensão.
Característica: Gera força ou tensão constante (que não se altera), mesmo com alteração do comprimento do músculo. Há deslocamento do segmento devido a uma desigualdade de forças entre a potência muscular e a resistência. É o tipo de contração que gera movimento.
Divisões (Muito Importante!):
Contração Concêntrica: Acontece quando a potência muscular é maior que a resistência. A fibra muscular diminui de tamanho (encurta-se), ou seja, a origem do músculo se aproxima de sua inserção. Ex: Realizar a extensão do quadril pela contração do quadríceps femoral.
Contração Excêntrica: Acontece quando a resistência é maior que a potência muscular. As fibras musculares se alongam enquanto exercem tensão, fazendo com que o ponto de origem do músculo se afaste da inserção. Ex: O retorno do movimento de extensão do quadril, onde o quadríceps femoral contrai-se lentamente para controlar a volta do movimento.
Uso em Treinamento: É a modalidade de treinamento de força mais popular. Embora o peso seja constante, o torque motor desenvolvido pelo músculo varia ao longo da amplitude de movimento.
Contração Isocinética:
Significado: "Iso" = igual, "cinética" = velocidade.
Característica: A tensão desenvolvida pelo músculo é máxima em todos os ângulos articulares durante toda a amplitude de movimento, pois é realizada em uma velocidade constante. A velocidade é controlada por um aparelho, e a resistência é variada ao longo do arco de movimento.
Vantagens: Permite contração máxima em toda a amplitude de movimento, otimizando o rendimento muscular; a sobrecarga nas articulações é controlada pela força do paciente; e possibilita uma gama de testes musculares com diferentes velocidades e posturas.
Aplicação: Usada para trabalhar força e endurance (resistência), melhorando o desempenho.
4.3. Fadiga Muscular e Cãibras: Mesmo com a complexidade e eficiência da contração, os músculos esqueléticos podem entrar em fadiga muscular. A fadiga ocorre quando há falta de ATP (necessário tanto para contrair quanto para relaxar as pontes cruzadas) ou liberação inadequada de Ca²⁺ após contrações repetidas.
A fadiga pode levar à incapacidade de contração (músculo irresponsivo) ou incapacidade de relaxamento (cãibra).
Causas de Cãibras (muito cobrado!): A cãibra nem sempre é resultado de fadiga muscular. Outras causas incluem: estresse emocional e físico, má qualidade do sono, desidratação, estiramento de músculos e ligamentos, sobrecarga muscular, atividade física além do limite, fratura óssea, torção ou contusão, gravidez, abuso de álcool, e excesso ou desequilíbrio de cálcio, magnésio, sódio e potássio.
4.4. O Fenômeno do Rigor Mortis (Importante!): O rigor mortis é um estado de rigidez muscular que ocorre após a morte.
Mecanismo: Com a morte, as membranas celulares tornam-se permeáveis, liberando todo o Ca²⁺ do retículo sarcoplasmático para o sarcoplasma, o que promove a contração. Como não há mais produção de ATP, as pontes cruzadas de miosina e actina ficam impedidas de se dissolverem, mantendo a contração e a rigidez.
Reversão: Cerca de 24 horas após a morte, o rompimento dos lisossomos e a liberação de suas enzimas proteolíticas digerem as pontes cruzadas, e os músculos voltam a relaxar.
4.5. Tônus Muscular: Mesmo em repouso, os músculos esqueléticos não estão completamente relaxados. Estímulos constantes vindos da medula espinhal mantêm os músculos sempre ligeiramente contraídos. Isso é o que chamamos de tônus muscular.
4.6. Relação Comprimento-Tensão do Sarcômero: A força máxima que um músculo pode desenvolver durante a contração depende de seu comprimento inicial (estado de estiramento) antes da contração.
Para que a interação actina-miosina ocorra eficientemente, o sarcômero precisa ter uma zona ideal de sobreposição dos miofilamentos.
Se um músculo está muito encurtado, os filamentos finos se sobrepõem uns aos outros, dificultando a interação com os filamentos grossos, resultando em baixa força.
Se um músculo está estirado demais, os filamentos finos podem não se sobrepor aos grossos, impedindo a formação de pontes cruzadas e a geração de força.
O desempenho ideal ocorre em um comprimento intermediário, onde a interação entre os filamentos finos e grossos é máxima. É por isso que o alongamento antes de exercícios pode melhorar a eficácia das contrações musculares.
4.7. Remodelação Muscular: Hipertrofia e Atrofia: A musculatura esquelética tem uma notável capacidade de remodelação, seguindo a "Lei do Uso e Desuso":
Hipertrofia: Períodos de contração muscular com força máxima (como no treinamento de força) tendem a aumentar o volume das células musculares, através do aumento do número e do tamanho das miofibrilas. Pessoas tentam manter este tipo de trabalho para aumentar o tamanho do músculo.
Atrofia: Períodos de inatividade ou encurtamento tendem a diminuir o volume e o comprimento das células, respectivamente. A atrofia pode ser severa em casos de desnervação muscular, onde os impulsos nervosos cessam, levando à morte das células musculares e substituição por tecido conjuntivo, um processo irreversível após cerca de três meses.
Embora o princípio básico de deslizamento dos miofilamentos seja o mesmo, a contração do músculo liso apresenta diferenças cruciais em relação ao esquelético:
Ausência de Sarcômeros: Como não possui estriações, o músculo liso não apresenta sarcômeros. Os miofilamentos estão presentes, mas organizados de maneira diferente.
Corpos Densos: Os filamentos finos estão presos a estruturas chamadas corpos densos, que são os correspondentes funcionais dos discos Z e se prendem ao sarcolema. Quando a miosina puxa a actina, o filamento fino arrasta o sarcolema, fazendo com que a célula se retraia em todas as direções.
Mecanismo do Cálcio (Diferença Crucial!): O filamento fino do músculo liso não apresenta troponina. Em vez disso, o Ca²⁺ interage com a calmodulina, desencadeando reações que culminam com a quebra do ATP da cabeça da miosina e a formação de pontes cruzadas.
Fonte de Cálcio: Diferente do músculo esquelético, a principal fonte de Ca²⁺ para o músculo liso é o meio extracelular.
Velocidade e Eficiência: O ciclo de pontes cruzadas no músculo liso é mais lento. Após o estímulo, a fibra muscular lisa pode sustentar a contração com baixo consumo de energia, através de um mecanismo chamado de "tranca" (latch mechanism), o que o torna muito mais econômico em comparação com o músculo esquelético.
Tempo de Contração: O tempo para o início e término da contração é maior no músculo liso do que no esquelético.
Força de Contração: A força de contração do músculo liso é, surpreendentemente, maior que a do esquelético.
Porcentagem de Encurtamento: A porcentagem de encurtamento também é maior no músculo liso.
Controle da Contração Lisa: É autonômico, ou seja, independe da nossa vontade.
Junção Neuromuscular Difusa: Não há goteira sináptica nem placa motora, como no músculo esquelético. As ramificações dos neurônios autonômicos liberam neurotransmissores que se difundem no líquido extracelular e contatam receptores no sarcolema.
Potenciais de Ação: Podem ser em "ponta" (como no esquelético) ou em "platô" (mais lentos, devido a canais de Ca²⁺/Na⁺ mais lentos).
Ondas Lentas Rítmicas: Alguns músculos lisos, como o intestino, possuem um potencial de repouso oscilante, que pode levar à deflagração de potenciais de ação e contração em resposta a um estiramento. Esta é a base dos movimentos peristálticos gastrointestinais.
A força muscular é um componente importantíssimo em programas de exercícios físicos, sendo crucial para a manutenção da qualidade de vida. É um tema central em diversas áreas, incluindo a reabilitação e o condicionamento físico.
6.1. Força Muscular e Envelhecimento:
A força muscular atinge seu máximo entre a segunda e terceira décadas de vida, declinando lentamente até os 50 anos, e mais rapidamente (12% a 15% por década) após os 65 anos.
A diminuição da força muscular impacta negativamente a autonomia funcional de idosos, aumentando o risco de quedas e fraturas, e reduzindo a qualidade de vida ao dificultar tarefas diárias.
A boa notícia é que a força muscular pode melhorar em idosos com programas de treinamento com sobrecargas. Este tipo de treinamento melhora a função e a estrutura muscular, articular e óssea em qualquer idade.
6.2. Variáveis do Treinamento de Força: O que dizem os Estudos? Os benefícios do treinamento de força dependem da manipulação de diversas variáveis:
Intensidade da Carga (Sobrecarga): Representa o percentual de 1RM (repetição máxima) ou o número de repetições máximas que o indivíduo consegue executar.
Prioridade para Cargas Altas: Há fortes evidências de que cargas de alta intensidade (acima de 75% de 1RM, ou geralmente em torno de 80% de 1RM) são mais eficazes para induzir um aumento significativo de força em idosos, em comparação com cargas mais baixas (40-65% de 1RM). Os ganhos médios com alta intensidade foram de 55,6%, contra 39,9% com baixa intensidade.
Mecanismo: Isso é explicado principalmente pelas adaptações neurais (aumento da frequência e recrutamento de unidades motoras) e, posteriormente, adaptações hipertróficas. O trabalho neural intenso pode ativar fibras musculares subutilizadas.
Importante: Embora a maioria dos estudos apoie altas cargas, ainda existem dúvidas sobre programas com carga variada ou efeitos de períodos curtos/longos de treinamento na população idosa.
Número de Séries:
Estudos comparativos sobre a influência do número de séries no ganho de força em idosos são escassos e inconsistentes.
Alguns estudos não encontraram diferenças significativas entre diferentes números de séries (e cargas equivalentes de trabalho total).
A maioria dos estudos analisados utiliza três séries (13 de 22 estudos), mas a análise média não mostrou que três séries são significativamente melhores do que duas ou uma. Por exemplo, a média de ganhos para três séries foi de 40%, duas séries de 37,3%, e uma série de 58%. Isso pode sugerir que a relação não é linear e que diferentes combinações podem ser igualmente eficientes.
Exceção/Destaque: Um estudo que aumentou progressivamente a intensidade da carga e o número de séries ao longo de seis meses resultou em um aumento impressionante de 235% na força. Isso reforça a eficácia de cargas intensas, embora o delineamento seja incomum.
Frequência Semanal:
Também há poucos estudos comparativos sobre a frequência semanal ideal para ganho de força em idosos.
Um estudo não encontrou diferenças significativas entre treinar uma, duas ou três vezes por semana.
No entanto, a grande maioria dos estudos (19 de 22) utiliza uma frequência de três vezes por semana, seguindo, muitas vezes, as recomendações do Colégio Americano de Medicina do Esporte (ACSM) para adultos jovens e saudáveis, sem evidências específicas para idosos.
Intervalos de Recuperação entre Séries e Exercícios:
Essa variável tem recebido menor atenção por parte dos pesquisadores e não foi objeto central de investigação em muitos estudos.
Dos estudos que descreveram, os intervalos variaram de um a três minutos. A maioria adotou dois minutos como tempo médio, mesmo sem evidências claras de que seja o ideal para idosos.
Ordem dos Exercícios:
É a variável que recebe a menor atenção e não foi alvo de investigação específica. Muitos estudos sequer descrevem a ordem utilizada.
As recomendações usuais (grandes grupos musculares antes de pequenos) carecem de respaldo científico sólido em muitos casos, especialmente para idosos.
6.3. Lacunas na Pesquisa (Oportunidades para Futuros Profissionais!): Existem lacunas significativas na pesquisa sobre a melhor combinação das variáveis do treinamento de força para idosos. A incerteza é ainda maior do que para adultos jovens. É necessário mais esforço para realizar estudos comparativos que aliem efetividade e segurança na prescrição de exercícios para essa população.
Compreender o sistema muscular é ir além da anatomia e fisiologia básicas; é desvendar os complexos mecanismos que nos permitem interagir com o mundo, desde o piscar dos olhos até o levantamento de grandes pesos. Exploramos os tipos de músculos e suas particularidades, os segredos do sarcômero e a vital função do cálcio e do ATP no intrincado balé molecular da contração muscular.
Lembre-se dos pontos-chave:
Cálcio é o maestro da contração: Sem ele, o espetáculo do movimento não acontece.
ATP é a energia: Essencial tanto para contrair quanto para relaxar.
Isométrica, Isotônica, Isocinética: Domine essas classificações, elas são a base da intervenção em saúde e do treinamento.
Músculo Esquelético vs. Liso: Atente-se às diferenças de controle, estrutura e mecanismo do cálcio.
Treinamento de Força: Cargas mais altas para idosos tendem a ser mais eficazes para o ganho de força, mas muitas variáveis ainda precisam de mais pesquisa focada nessa população.
Qual é a principal diferença entre os músculos estriados esqueléticos e os músculos lisos?
a) Os músculos estriados esqueléticos são controlados pelo sistema nervoso autônomo, enquanto os músculos lisos são controlados conscientemente.
b) Os músculos estriados esqueléticos são involuntários, enquanto os músculos lisos são controlados conscientemente.
c) Os músculos estriados esqueléticos são responsáveis pela locomoção voluntária, enquanto os músculos lisos estão presentes em órgãos internos e são involuntários.
d) Os músculos estriados esqueléticos têm estrias transversais visíveis, enquanto os músculos lisos não possuem estrias.
O que são os discos intercalares encontrados nos músculos estriados cardíacos?
a) Junções especializadas entre as células musculares cardíacas que permitem a contração coordenada do coração.
b) Estruturas responsáveis pela liberação de íons cálcio na célula muscular.
c) Proteínas contráteis presentes nas células musculares esqueléticas.
d) Componentes do sistema nervoso que controlam os impulsos elétricos nos músculos cardíacos.
Qual é a principal proteína contrátil envolvida na contração muscular?
a) Actina
b) ATP
c) Miosina
d) Cálcio
Gabarito:
c) Os músculos estriados esqueléticos são responsáveis pela locomoção voluntária, enquanto os músculos lisos estão presentes em órgãos internos e são involuntários.
a) Junções especializadas entre as células musculares cardíacas que permitem a contração coordenada do coração.
c) Miosina