O Classicismo representa um dos períodos mais importantes e influentes da história da literatura e da arte ocidental, sendo a estética literária do Renascimento. Buscado intensamente em concursos públicos e no ENEM, este movimento cultural, que floresceu no século XVI, marcou a transição da Idade Média para a Idade Moderna e significou um profundo resgate dos ideais da Antiguidade Clássica greco-romana.
Classicismo é o nome historiográfico de um movimento cultural, estético e intelectual, que se inspirou nos padrões estéticos e filosóficos da antiguidade clássica (Grécia Antiga e Roma).
Na literatura portuguesa, o Classicismo corresponde ao período entre 1527 e 1580.
O Classicismo ocorre dentro de um grandioso momento histórico social chamado Renascimento Cultural. A palavra "Classicismo" decorre da "ressurreição" dos escritores clássicos da Antiguidade greco-latina.
Início em Portugal: 1527, com o retorno de Francisco de Sá de Miranda da Itália, trazendo o "doce estilo novo" (dolce stil nuovo).
Fim em Portugal: 1580, ano que marca a morte de Luís Vaz de Camões e a passagem de Portugal para o domínio espanhol (a "derrocada do país lusitano").
O Renascimento e, por consequência, o Classicismo, promovem uma transformação radical no modelo medieval.
Paradigma Anterior (Idade Média) | Paradigma Classicista/Renascimento (Séc. XVI) |
Teocentrismo (Deus como centro) | Antropocentrismo (Homem como centro) |
Medida Velha (Redondilhas: 5 ou 7 sílabas poéticas) | Medida Nova (Decassílabo: 10 sílabas poéticas) |
Fé e Dogma (Monopólio da Igreja) | Razão e Cientificismo (Valorização do saber e do intelecto) |
O homem do século XVI, sob o ideal do Classicismo, voltava-se para a realidade concreta e acreditava na sua capacidade de dominar e transformar o mundo.
O surgimento do Classicismo está profundamente ligado ao contexto de profundas transformações sociais, económicas, culturais e religiosas.
No final do século XV, Portugal viveu o seu apogeu como nação.
Grandes Navegações e Descobertas: A expansão marítima, como a chegada de Vasco da Gama às Índias (1498) e o descobrimento do Brasil (1500), conferiu ao povo português relevância histórica e um alargamento do horizonte geográfico.
Prosperidade Econômica: Lisboa tornou-se um centro comercial de primeira importância, e a corte vivia um luxo desmedido e uma atmosfera de desafogo financeiro.
Consequência na Literatura: A atividade literária classicista refletia essa atmosfera de exaltação épica, coragem e riquezas.
O Renascimento promoveu o interesse pela cultura clássica que já vinha ocorrendo desde o final do século XIII, na Itália.
Racionalismo e Cientificismo: O Renascimento, sendo um movimento científico e cultural, elaborou novas teorias e invenções, como o modelo heliocêntrico de Copérnico e a invenção da imprensa por Gutemberg. O Classicismo valoriza o saber concreto, científico e objetivo em detrimento do abstrato.
Humanismo como Base: O Classicismo é a estética do Renascimento e surge como desenvolvimento natural do Humanismo. O Humanismo, que o antecedeu, já trazia o interesse pela cultura clássica e a valorização do homem.
O Homem no Centro: A mentalidade passou a ser antropocêntrica (o homem em evidência), em substituição ao teocentrismo. A máxima "o homem como medida de todas as coisas" (atribuída a Protágoras, filósofo grego antigo) exemplifica esse ideal.
As características do Classicismo são decorrentes da imitação dos antigos gregos e latinos, que eram considerados modelos de perfeição estética.
O espírito clássico procura o equilíbrio, a harmonia, a pureza formal e o rigor estético.
Racionalismo (Predomínio da Razão): A razão controla a expressão das emoções para evitar exageros. O clássico busca entender a harmonia do Universo utilizando a Razão ou a inteligência. O Classicismo defende a valorização da racionalidade em oposição à sentimentalidade.
Busca pela Beleza, o Bem e a Verdade: O Classicismo procura atingir verdades eternas e superiores em uma concepção absolutista de arte. Isso implica na busca da Beleza, o Bem e a Verdade (escritas com maiúsculas iniciais, segundo Moisés).
Objetividade e Impessoalidade: Os textos tendem a ser claros, transparentes e diretamente objetivos, fugindo do subjetivo. O que vale é a obra, não o que sente ou pensa o autor, que deve desaparecer perante a obra.
Universalismo: A arte classicista expressa verdades universais. Os temas abordados, como o sentimento amoroso, são válidos para todas as épocas e lugares, como notado na universalidade da lírica camoniana.
A imitação dos modelos clássicos (como Platão, Homero e Virgílio) levou à adoção de formas fixas e métricas rigorosas.
Perfeição Formal/Rigor Formal: Há uma preocupação excessiva com a forma, em detrimento do conteúdo (uma característica das artes de inspiração clássica).
Medida Nova: O verso deixou de ser escrito nas redondilhas medievais (medida velha) e passou a ser o decassílabo (dez sílabas poéticas), também chamado de medida nova.
O Soneto: Introduzido por Sá de Miranda, o soneto é a forma fixa mais importante, composta por 14 versos decassilábicos distribuídos em dois quartetos e dois tercetos. O soneto petrarquiano, com rimas ABBA nos quartetos, foi uma referência.
Outros Gêneros Clássicos: Foram valorizados a Ode, a Elegia, a Écloga e, principalmente, a Epopeia. O Classicismo prezava a separação dos gêneros textuais (a poesia lírica não deveria se misturar à épica, por exemplo).
O Classicismo trouxe o reencontro com a mitologia pagã.
Mitologia Greco-Romana: A presença de entidades mitológicas e deuses (como Neptuno e Marte, Baco e Vênus) era fundamental, misturando-se (fusionismo) com a religião cristã.
Neoplatonismo: O movimento valorizou o Neoplatonismo, uma escola filosófica que retomava a concepção de amor de Platão. Segundo essa visão, o amor se concretizaria no plano das ideias (espiritual) e não a partir da matéria carnal, buscando a purificação da alma. Essa dualidade é frequentemente explorada, como na lírica camoniana.
Mimese: Os classicistas buscavam a mimesis (imitatio naturae), ou seja, a imitação da Natureza, vista como perfeita e ordenada, para criar uma obra que fosse reflexo de uma natureza que segue leis universais.
O Classicismo português (1527-1580) se destacou por valorizar temas modernos (como o neoplatonismo amoroso) e, sobretudo, o aspeto nacionalista devido às grandes navegações.
Sá de Miranda é o pioneiro do Classicismo em Portugal e marca o momento inicial do movimento.
Inovação Formal: Ele introduziu o verso decassilábico (medida nova), o soneto, a canção da sextina, e as produções em tercetos e oitavas em língua portuguesa.
Temas: Suas temáticas incluíam a reflexão moral, filosófica e política, além do lirismo amoroso. Seu soneto muitas vezes expressava o amor platônico, tendo apenas existência espiritual, ao modo petrarquiano.
Camões é considerado o mais importante escritor de língua portuguesa e o nome mais expressivo do Classicismo português. Sua obra é de alta recorrência em exames.
Massaud Moisés (1999) lhe confere notoriedade maior do que os demais poetas do movimento.
A obra de Camões se divide em dois eixos principais: poesia lírica e poesia épica.
Poesia Lírica (Sonetos, Canções, Odes) | Poesia Épica (Os Lusíadas) |
Gênero: Focado nas emoções e no mundo interior ("eu"). | Gênero: Focado nos grandes feitos de um povo (heroismo coletivo). |
Temática central: Amor (platônico/sensual) e o Desconcerto do Mundo. | Temática central: Exaltação dos feitos heroicos dos portugueses nas Grandes Navegações. |
Estilo: Usa a Medida Nova (decassílabos) e a Medida Velha (redondilhas), explorando contradições (antíteses). | Estilo: Rigor formal clássico (estrutura da epopeia, linguagem culta e elevada). |
Dualidade: Explora a contradição entre o amor espiritual (Neoplatonismo) e o amor carnal (sensual), vida e morte, razão e sem-razão de vida. | Dualidade: Nacionalismo vs. Crítica (Exaltação dos feitos versus críticas à ambição e cobiça dos portugueses). |
Os Lusíadas é a obra-prima de Camões, considerada a maior epopeia já escrita em português.
A obra segue rigorosamente os moldes das epopeias clássicas, como a Odisseia e a Ilíada (atribuídas a Homero) e a Eneida (de Virgílio). É estruturada em 10 cantos com um total de 8.816 versos em oitava rima.
A estrutura é didaticamente dividida em cinco partes essenciais, frequentemente cobradas em provas:
Proposição: Apresentação do assunto principal, que é o canto ao "peito ilustre Lusitano". O poeta exalta a empreitada marítima portuguesa, considerando-a superior às navegações de gregos e romanos.
Invocação: Pedido de inspiração às Tágides (ninfas do rio Tejo).
Dedicatória: Dedicação da obra ao Rei D. Sebastião.
Narração: O corpo central do poema, que conta a viagem de Vasco da Gama de Lisboa à Índia (1498).
Epílogo: Final da obra, com a conclusão do poeta (frequentemente com o tom pessimista e crítico de Camões).
Uma característica notável (e ponto chave para exames) é a convivência de elementos que o Classicismo busca conciliar:
Mitologia e Religião: A viagem real de Vasco da Gama se mistura a uma narrativa mitológica. Por exemplo, Baco se volta contra os portugueses, e Vênus os apoia. Ao mesmo tempo, o ideário medieval (crenças católicas) não é totalmente abandonado, coexistindo com a cultura clássica. Em um momento crítico, Vasco da Gama reza (Catolicismo) após o confronto com o Gigante Adamastor (Mitologia).
Foco no Coletivo (Épica): O herói da epopeia (Vasco da Gama) representa não apenas o indivíduo singular, mas sobretudo o heroísmo de todo um povo.
Este é um dos episódios mais cobrados, pois simboliza os desafios e a coragem portuguesa:
O Mito: Adamastor é o gigante que representa o Cabo das Tormentas (Cabo da Boa Esperança). Ele profetiza desastres e sofrimento contra os portugueses.
Símbolo da Coragem: O enfrentamento do Gigante Adamastor pela frota portuguesa exalta a coragem dos portugueses.
Uso Didático: O episódio permite analisar a estrutura épica (a aparição de seres mitológicos) e a coexistência de mitos com a religião (Gama reza após o encontro).
Embora a epopeia exalte os feitos lusitanos, Camões insere uma visão crítica e pessimista sobre a motivação das Grandes Navegações (outro ponto crucial em provas).
A Voz da Crítica: O episódio do Velho do Restelo (Canto IV) denuncia a ambição desmedida e a cobiça que moviam os conquistadores.
O Desencanto: Camões critica o fato de a nação estar "metida no gosto da cobiça e na rudeza duma austera, apagada e vil tristeza". Ele alerta que o sonho de grandeza de Portugal pode ser prejudicado pela ambição. Esse olhar crítico se opõe ao ufanismo.
A lírica camoniana (majoritariamente em sonetos) explora o universo interior do poeta ("eu"), abordando temas como o amor, a Pátria, a vida e Deus.
Paradoxo e Antítese (Figuras de Linguagem Cobradas): Camões utiliza intensamente o paradoxo e a antítese para expressar as contradições do sentimento amoroso e o desconcerto do mundo.
Exemplo (Soneto "Amor é fogo que arde..."): Define o amor usando opostos: "É ferida que dói e não se sente; / É um contentamento descontente; / É dor que desatina sem doer".
Neoplatonismo Amoroso (Amor Idealizado): Em sonetos como "Transforma-se o amador na cousa amada", o poeta constrói a ideia do amor platônico, onde o sujeito alcança a completude e a plenitude por meio de uma visão espiritualizada e idealizada da mulher. A mulher é vista como "linda e pura semideia", com perfeição divina.
Embora a poesia de Camões tenha ofuscado muitos, outros escritores merecem menção:
Poetas Menores: Autores como Pêro de Andrade Caminha, Frei Agostinho da Cruz e Diogo Bernardes foram, por vezes, criticados por Massaud Moisés por imitarem muito as regras clássicas sem originalidade.
Historiografia: João de Barros destacou-se por realizar uma historiografia que se aproximava dos modelos latinos, cimentando o otimismo e a presença histórica do povo português com fatos e documentos verídicos.
Literatura de Viagens: Relatos, diários e roteiros de viagem eram produzidos para fixar e transmitir as novas esferas e paisagens descobertas.
Prosa Doutrinária: Dividida em direção laica e religiosa, este gênero ficou um tanto disperso no meio literário.
Teatro Clássico: Embora nomes como Sá de Miranda e Antônio Ferreira tenham escrito teatro, este se tornou secundário em relação ao teatro vicentino, dada a "pobreza desse teatro" e a falta de talento cênico autêntico.
O Classicismo influenciou profundamente as artes plásticas, buscando a harmonia, o equilíbrio e a proporção formal.
Exaltação do Corpo Humano: A arte classicista era marcada pela visão antropocêntrica e evidenciava a beleza do corpo humano (como em A Criação de Adão de Michelangelo ou O Nascimento de Vênus de Botticelli).
O Nascimento de Vênus (Botticelli): Inspirada na mitologia clássica, esta obra exemplifica o resgate da cultura greco-romana, a harmonia e a perfeição do corpo.
A Criação de Adão (Michelangelo): O afresco ilustra o embate entre o antropocentrismo e o teocentrismo. A análise detalhada da obra (com a possibilidade de o manto de Deus se assemelhar a um cérebro) reflete o racionalismo e as descobertas científicas e anatômicas da época.
Arquitetura Clássica: Derivada da Grécia e Roma Antigas, a arquitetura classicista busca a simetria e clareza, utilizando elementos como as cinco ordens de colunas e frontões.
O Classicismo não é um movimento isolado; ele é a base de várias tendências posteriores e é atemporal.
Quinhentismo no Brasil: No Brasil Colônia, o Classicismo português influenciou a literatura dos anos 1500, conhecida como Quinhentismo (ex: Prosopopéia de Bento Teixeira, que imitava Camões), sendo o principal marco a Carta de Achamento de Pero Vaz Caminha.
Neoclassicismo (Século XVIII): O Classicismo ressurge posteriormente como Neoclassicismo, fomentado pelo Iluminismo e pelas descobertas arqueológicas de Pompeia e Herculano. O Neoclassicismo reinterpretou a beleza clássica de forma mais inovadora, focando mais na cultura e literatura gregas, embora seus autores estivessem mais agitados por "ansiedades" do que a serenidade buscada pelos renascentistas.
Influência Recente: A universalidade e a forma do soneto clássico continuam a ser retomadas, como na canção Monte Castelo (Legião Urbana) ou nos sonetos de Vinicius de Moraes (que, ao contrário de Camões, trata o amor como efêmero, não eterno, mas mantém a forma).
Não, o Classicismo é a estética literária e artística que surgiu dentro do Renascimento Cultural. O Renascimento é o movimento cultural, científico e social amplo que ocorreu na Europa a partir do século XV; o Classicismo é a manifestação desse movimento que resgata os ideais da Antiguidade Clássica.
A Medida Nova refere-se ao uso de versos decassílabos (dez sílabas métricas) na poesia. Ela é importante porque simboliza a ruptura com a Medida Velha (redondilhas), ligada à tradição medieval. A adoção do decassílabo, trazido por Sá de Miranda da Itália, representava a busca pela perfeição formal e o alinhamento com os padrões clássicos.
O Neoplatonismo é a retomada da filosofia de Platão. Na poesia, especialmente na lírica de Camões, significa que o amor é visto de forma espiritual e idealizada, existindo no plano das ideias, sendo superior aos desejos carnais e buscando a purificação da alma. É um reflexo da valorização da razão sobre a matéria.
Os Lusíadas (1572), de Luís Vaz de Camões, é fundamental porque é a maior epopeia em língua portuguesa, narrando os feitos históricos do povo português (as Grandes Navegações). A obra não apenas exalta a coragem e o nacionalismo lusitano, mas também consolida e eleva a língua portuguesa como um veículo de poesia erudita.
Didaticamente, o Trovadorismo (Idade Média) antecede o Humanismo, que por sua vez, antecede e prepara o Classicismo/Renascimento.
O Trovadorismo (Idade Média) estava sob o teocentrismo e usava a Medida Velha (redondilhas).
O Humanismo (final da Idade Média) inicia a transição, trazendo a valorização dos intelectuais e o interesse pela cultura clássica, antecipando o antropocentrismo.
O Classicismo é a concretização artística do Renascimento, adotando o antropocentrismo e a Medida Nova. É importante notar que os movimentos literários não têm uma ruptura brutal, mas sim uma evolução gradual.